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Trump ou Hillary: o que o Brasil deve esperar?

Forma como candidatos republicano e democrata encaram questões dá pistas do que o País pode aguardar do próximo presidente americano

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Com exceção das inflamadas promessas de Donald Trump para imigração, a América Latina é tema periférico na atual corrida à Casa Branca. Até aqui, pouco se falou de concreto sobre a região – e o Brasil sequer foi mencionado tanto pelo republicano quanto pela democrata Hillary Clinton.

Mas a forma como os candidatos e seus partidos tratam questões como economia, relações comerciais e diplomáticas com o resto do mundo pode dar pistas sobre o que o Brasil pode esperar de quem chegar à Casa Branca.

No caso de Trump, por exemplo, além da questão migratória, as fortes críticas à China e a política protecionista apregoada por ele são vistas como um sinal, segundo analistas, de que o Brasil pode ter muito a perder caso ele se torne o próximo presidente.

Já as chances cada vez mais reais de vitória de Hillary são observadas com certa cautela. Isso porque, apesar de apresentar um discurso mais favorável às ambições comerciais brasileiras, ela ainda não deu claras indicações sobre que lugar a América Latina ocupará em sua agenda.

“Em termos relativos, seria um grande alívio para o Brasil se Hillary ganhar. Mas em termos absolutos, não seria tão diferente do governo de Barack Obama, que vem mostrando interesse médio ou baixo no Brasil”, aponta Timothy Power, diretor do programa de estudos brasileiros da Universidade de Oxford.

Segundo ele, em contrapartida, um governo Trump – que em 2014 sequer sabia quem era Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva, em entrevista à revista Veja – seria um “desastre não apenas para os EUA e o Brasil, mas para a ordem internacional”.

Uma vitória de Donald Trump também é vista com preocupação pelo cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília. Ele acredita que a política externa restritiva e conservadora do candidato republicano poderá ser bastante prejudicial ao Brasil.

Além de limitar o comércio exterior para obter saldo positivo na balança comercial – o que afetaria as exportações brasileiras para os EUA, segundo maior parceiro do Brasil –, na Casa Branca o magnata poderá ainda atrapalhar o plano do governo Michel Temer de atrair investidores estrangeiros, entre eles americanos.

Fleischer ainda destaca a questão da imigração. “Está cheio de brasileiro sem documentação nos EUA. Se Trump decidir expulsar todos os estrangeiros em situação irregular, muito brasileiro vai ser deportado também.”

Chance à reaproximação

Considerando um cenário com Hillary na Casa Branca, Timothy Power avalia que a maior mudança nas relações bilaterais virá, na verdade, do Brasil: com José Serra à frente do Itamaraty, o governo Temer vem se posicionando de maneira mais alinhada com os Estados Unidos e Europa do que sua antecessora Dilma Rousseff, abrindo mais o país a investimentos externos e com uma postura menos amigável a países vizinhos de orientação de esquerda.

Durante os dois mandatos de Lula e os cinco anos de Dilma na presidência da República, o Brasil manteve os olhos voltados para América do Sul e alguns países africanos e asiáticos. Em 2013, as relações da petista com Washington ficaram abaladas após a divulgação de que a Agência de Segurança Nacional (NSA) espionava as comunicações de Dilma, além de outros líderes latino-americanos.

Na época, a então presidente cancelou uma viagem que faria aos EUA e fez duras críticas ao governo americano. “O resto do governo Dilma ficou mais antiamericano do que o que já era antes”, lembra Fleischer.

Em março deste ano, em meio ao processo de impeachment que culminou com a queda da petista, Obama foi vago ao comentar o assunto durante visita à Argentina, limitando-se a dizer que Brasil possuía “uma democracia suficientemente madura, além de leis e instituições fortes o suficiente” para resolver a questão.

Otimista, Fleisher acredita as relações entre Brasil-EUA têm boas chances de ganhar impulso em uma eventual gestão Hillary: “Temos que nos guiar um pouco pela atuação dela como secretária de Estado, em que ela deu mais atenção para a América Latina do que seus antecessores.”

Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimento, concorda com Fleischer, mas ela acredita que, inicialmente, a democrata deverá se voltar às questões internas. Zeina ressalta o alto índice de rejeição de Hillary e o desafio de pacificar a sociedade americana pós-eleições e conquistar apoio do Congresso. “O país terá que dar uma sacudida em sua agenda.”

Economia e relações comerciais

A postura menos liberal do que Obama apresentada por Hillary durante a campanha vem sendo acompanhada de perto por analistas econômicos no Brasil.

Cláudio Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria Internacional de Negócios, lembra que a ex-primeira-dama afirmou que não assinará a Parceria Transpacífico de livre-comércio entre 12 países, a chamada TTP, e acredita que ela poderá acionar com mais frequência mecanismos antidumping da Organização Mundial de Comércio (OMC).

Frishtak prevê ainda que a democrata deverá ser mais firme que seu antecessor com relação à imigração, tema de acalorados debates nos EUA. No entanto, ele opina, “Hillary não deve mudar a política econômica do país porque, em grande medida, está dando certo”.

Já a política econômica defendida por Trump traz ingredientes que podem levar a uma recessão global ou até a um “colapso do comércio mundial” pois, na prática, opina Frischtak, ele dá sinais de que não seguirá as regras da OMC. “Não há um único economista de peso que o apoie.”

Outra preocupação apontada por Zeina Latif é com um eventual retrocesso no diálogo com a China, o que, ela acredita, afetaria negativamente todo o mundo emergente indiretamente, incluindo o Brasil. A economista, no entanto, tenta enxergar os discursos protecionistas de Trump de maneira  cética.

“Apesar de ele ter um discurso que beira a irresponsabilidade, não acredito que isso se traduziria de forma concreta numa agenda econômica. A tendência é ele descer do palanque e ter uma gestão mais responsável”, aposta.

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