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Da Ucrânia a Gaza, a geopolítica marcará presença em Paris-2024

Será que o evento conseguirá evitar os perigos dos conflitos atualmente em curso?

Foto por Fabrice COFFRINI / AFP
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Evitando boicotes e exclusões, o COI conseguiu reunir delegações de todo o mundo para os Jogos Olímpicos de Paris (26 de julho a 11 de agosto), mas ainda enfrenta o desafio de alcançar uma bolha pacífica.

Qualquer “propaganda política” é proibida pela Carta Olímpica em recintos de competição ou pódios, mas a medida não se estende à Vila Olímpica ou às coletivas de imprensa.

Russos “neutros” e sob a lupa

A invasão russa da Ucrânia com o apoio de Belarus em fevereiro de 2022 pareceu durante muito tempo impedir a possibilidade de atletas das três nacionalidades coabitarem em Paris-2024: russos e bielorrussos foram banidos de quase todo o esporte mundial até março de 2023 e os ucranianos ameaçaram boicotar os Jogos se a sua presença na capital francesa fosse permitida.

Mas Kiev acabou por abandonar essa posição em meados de 2023 e o COI orquestrou uma reintegração progressiva de russos e bielorrussos em competições internacionais sob condições estritas: a título individual, sob uma bandeira neutra e desde que não tivessem “apoiado ativamente a guerra na Ucrânia” e que não tenham contrato com o exército ou com as agências de segurança do seu país.

Na sexta-feira, o COI anunciou a ampliação para 28 russos e 19 bielorrussos da sua lista de atletas autorizados a estar em Paris-2024, em nove modalidades (luta livre, levantamento de peso, ciclismo, trampolim, tênis, tiro, remo, judô e canoagem). A lista poderá ser expandida em breve.

De todo modo, será uma gota d’água em comparação com os 330 russos e 104 bielorrussos que estiveram presentes nos Jogos Olímpicos de Tóquio em 2021.

Além disso, estes “atletas neutros” estarão sujeitos a uma vigilância permanente: qualquer manifestação de apoio à ofensiva na Ucrânia, por exemplo com um “Z” simbolizando a invasão, implicará um procedimento que pode levar “à exclusão imediata dos Jogos”, alertou o presidente do COI, Thomas Bach, em declarações à AFP no final de abril.

Palestinos querem falar ao mundo

Desde os últimos meses do ano passado, o COI tem tentado manter-se fora da guerra entre Israel e o Hamas, protegendo-se atrás da “solução de dois Estados”. Os Comitês Olímpicos nacionais israelense e palestino coexistem desde 1995.

Nunca esteve em discussão que os atletas israelenses competissem sob uma bandeira neutra, apesar do fato de os bombardeios israelenses em retaliação ao sangrento ataque de 7 de outubro perpetrado pelo Hamas terem destruído as principais instituições esportivas em Gaza e terem matado personalidades do mundo olímpico.

O Comitê Olímpico palestino, que segundo o COI deveria ter “seis a oito representantes” graças aos convites, espera ter pelo menos uma plataforma perante o mundo graças aos Jogos.

“Paris é um momento histórico e importante para dizer ao mundo que já chega”, declarou o seu presidente, Jibril Rajub, em meados de junho.

Do lado israelense, o desafio centra-se sobretudo na segurança, como em todas as edições olímpicas desde a sangrenta tomada de reféns em Munique, em 1972: por enquanto, a delegação pretende “participar na cerimônia de abertura como qualquer outra equipe”, segundo seu Comitê Olímpico.

Afeganistão sem os talibãs

O retorno dos talibãs ao poder em Cabul, em meados de 2021, colocou as entidades esportivas em um dilema: como dosar o diálogo e a pressão para ajudar os atletas e o seu entorno, no exílio ou aqueles que permaneceram no país, sem ignorar a proibição à prática feminina do esporte?

Em meados de junho, o COI anunciou ter conseguido a presença em Paris de uma equipe afegã composta por três homens (no atletismo, natação e judô) e três mulheres (atletismo e ciclismo), sem revelar a sua identidade. Todos moram no exterior, exceto o judoca, afirmou posteriormente o diretor-geral do Comitê Olímpico afegão, Dad Mohammad Payenda Akhtari.

“Como o esporte feminino está suspenso no Afeganistão”, as três mulheres “do país não foram enviadas”, explicou.

O eco dado às suas atuações é uma das incógnitas destes Jogos. O COI esperava em meados de junho “lançar um símbolo muito forte para o mundo e para o Afeganistão”, segundo o seu porta-voz, Mark Adams.

O Afeganistão, que tem o terceiro maior contingente de exilados do mundo, também terá cinco representantes na Seleção Olímpica de Refugiados, incluindo a sua capitã, a ciclista Masomah Ali Zada.

Esta jovem pretende ir torcer pelos seus compatriotas que vão competir sob a bandeira afegã: “Estou muito feliz por haver três mulheres afegãs nos Jogos Olímpicos e por estarem em igualdade de condições com os homens”, disse ela recentemente à AFP.

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