Flor de Mururé acaba de lançar o álbum Croa, depois de construir seu universo musical entre estudos de música e o envolvimento na cultura popular.
“Croa significa coroa, cabeça, ori. Queria passar com essa palavra a ideia de ter cabeça para lidar com as situações da vida e seguir o caminho”, relata, em entrevista a CartaCapital.
Jovem artista transgênero, ele saiu de casa aos 16 anos, após tensão com a família. A mudança coincidiu com a sua saída também do destacado Conservatório Carlos Gomes, em Belém, depois de dez anos de estudos de violão, canto coral, violino e flauta.
Nas ruas da capital paraense, encontrou a cultura popular nas rodas de carimbó. “São manifestações de resistência, o que pela cidade é muito significativo, já que a gente não tem tanto espaço para isso.”
Com letras de sua autoria, o álbum combina a fé com ritmos ancestrais e amazônicos. “A construção do repertório se deu pela minha caminhada espiritual”, explica.
Com produção do experiente André Magalhães, o disco é muito bem executado sonoramente, com batuques, carimbó, guitarrada, além do coco e de outros ritmos urbanos.
O disco é tratado por Flor de Mururé como um manifesto LGBTQIA+. “Primeiro pela vida. Só o fato de estar vivo já é um manifesto”, resume. “Cantar da melhor forma, com as melhores pessoas possíveis. Fazer isso funcionar, para mim, é um manifesto. Estar dentro do terreiro (onde realizou suas pesquisas para o disco), fazendo essa movimentação… Nosso corpo é muito subjugado. A gente, às vezes, parece que não pode existir.”
O álbum conta com as participações do baiano Tiganá Santana, do grupo pernambucano Bongar e do paraense Trio Manari, além do mestre da guitarrada Manoel Cordeiro.
Oferece também a participação de diversos artistas transgênero: Anastácia Marshelly, Valesca Minaj, Mulambra, Rafaela Kennedy, Rafaela Cardoso, Iris da Selva, Borblue e Isabella Pamplona.
“Trazer algumas pessoas comigo é muito importante para mostrar nosso movimento, o que a gente está fazendo, que a gente existe, que a gente está se movimentando. A maioria é de irmãos de santo.”
O artista diz, também, ver a Amazônia como uma espécie de periferia do Brasil.
“E eu estou na periferia da periferia, sendo esse corpo marginalizado”, reflete. “Essa dificuldade dá um desânimo. É uma avalanche de conflitos. Não faço pela fama, faço pelo amor. É isso o que me move: amor pela música. Ela está há muito tempo comigo, não consigo me desvincular.”
O disco Croa está disponível nas plataformas de música. O projeto tem o patrocínio da Natura Musical e do governo paraense via Lei Semear e Fundação Cultural do Pará.
Assista à entrevista de Flor de Mururé a CartaCapital:
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