Diálogos da Fé

Blog dedicado à discussão de assuntos do momento sob a ótica de diferentes crenças e religiões

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Ashura, o martírio do imã Hussain

Os métodos cruéis usados contra os herdeiros do profeta se parecem àqueles do Estado Islâmico, que nada tem nada a ver com o islã

A peregrinação a Carbala só cresce
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“Oh, Alá, tu sabes que tudo que fazemos não é por desejos de poder político ou riquezas, mas para mostrar aos homens os brilhantes princípios e valores da tua religião e para defender os direitos de teus sevos oprimidos.” (Imã Hussain) 

Nesta semana entramos no mês de Moharram, início do calendário islâmico de 12 meses.

Foi no dia 10 de Moharram que aconteceu a Ashura, ou o martírio do imã Hussain, neto do profeta Mohammad e filho do imã Ali.

Desde a morte do profeta começa um distanciamento da suna (“caminho trilhado”, em português) profética, dos governantes que o sucederam.

O imã Ali, em seu califado (ele foi o quarto califa), tentou acabar com os abusos e privilégios que se estabeleceram com a ascensão de uma casta parasitária e endinheirada que em nada havia contribuído para a construção do islã.

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Desde a morte do profeta, estes se infiltravam com planos de transformar a religião em uma espécie de negócio dirigido por árabes coraixitas, ferindo e deformando os estatutos islâmicos que falam em um movimento espiritual de  convivência entre povos, sem distinção de raça, cor, gênero e com tolerância  religiosa, como era a constituição do governo de Medina.

Mas as ambições daqueles que se passavam por companheiros do profeta se opuseram à linha do imã Ali e não o deixaram governar e reintegrar os direitos dos pobres que a  dinastia que se formou, de ricos coraixitas, lhes negava.

Foi um tempo de opressão e derramamento de sangue.

Cinco décadas após a morte do profeta Mohammad, o califa Otman falece e Ali ibn Taleb seria destinado ao posto de quarto califa. Ele havia sido eleito em 656, mas foi contestado por Muwaiya, por Tahla e por Aisha .

Este então era um tempo muito duro para o islã e a família de Mohammad e os que defendiam estas ideias começaram a ser combatidos e perseguidos. E se chegaria à eliminação física de seus integrantes que seriam barbaramente assassinados.

Era o tempo do califado de Muwayia Ben Abi Sufiàn,  que durou de 661 a 680 d.C.  Em 657, Ali e Muwayia se enfrentam na batalha de Siffin,  mas ninguém saiu vencedor e se estabeleceu um acordo no qual Ali é nomeado califa .

O imã Ali era contra as diferenças feitas entre os muçulmanos árabes e não árabes, coraixitas e não coraixitas  e a corrupção que se espalhava  .

Havia um clã de ricos endinheirados que se achavam superiores e não gostavam dos discursos do imã em defesa dos pobres. Ali foi assassinado, esfaqueado pelas costas, enquanto se prostrava em oração, por um coraixita, em 661, em Cufa, Iraque. Sua esposa Fatima havia sido martirizada  durante o califado de Omar.

Ao se tornar califa e governante, Muwaiya cria uma inovação no islã e no sistema de califado e estabelece a monarquia, que tanto o profeta quanto o imã Ali condenavam e combateram.

Muwaiya nomeia seus filhos por decreto, dividindo o governo e colocando um governante de sua confiança em cada província criada por ele. Seu filho Yazid foi nomeado como seu sucessor, o que gerou  revoltas, pois este era um lúmpen, alcoólatra e conhecido como debochado. Ele e sua família não tinham realmente nada a ver com a construção do islã das origens. Sempre combateram o próprio profeta, combateram a Usmam e ao imã Ali. Foi um governo de hipocrisia, subornos e assassinatos.

Os  omíadas governaram de 661 a 750 d.C. Muwayia era até mesmo idólatra quando lhe era conveniente,  e esta gente, que sequer acreditava em Deus, viria a governar o islã sobre um governo tirano da dinastia, com Yazid  como chefe máximo no poder depois da  morte de Muwayia.

Hussain, o filho mais novo do imã Ali, opôs-se à corrupção e à tirania dos omíadas e lutou pela retomada do islã das origens contra a camarilha de Yazid  e do grupo de ricos de Meca .

Seu irmão mais velho, o imã Hassan, havia sido envenenado por agentes do regime, pois ele havia rompido todos os acordos com Muwayia.

Yazid  havia sido aconselhado por seu pai para não se chocar com o imã Hussain, mas o desobedece e decide se levantar por não tolerar seu movimento de retorno aos princípios do islã, o que poria fim a seus privilégios.

Hussain fica sabendo que Yazid planeja matá-lo em Meca e se vê encurralado, tendo de escapar da cidade para não ser morto.

Ele então é convidado pela gente de Cufa, Iraque, onde milhares de seguidores  lhe oferecem de 12 mil a 18 mil homens com espadas para consagrá-lo líder do Iraque. Ele sai  em caravana com toda sua família,  em um número de 22 indivíduos, incluindo mulheres, crianças e até um bebe recém-nascido. Também vão com ele uns 50 companheiros de fé como Abas e  Bilal, entre outros valorosos combatentes.

Todos seriam martirizados no meio do caminho, em  Carbala, antes de chegar a Cufa, em um cerco que durou 10 dias. Yazid infiltrou seus espiões e descobriu os planos do imã, que tinha por intenção unir-se a seus aliados no Iraque e combater o governo corrupto.

Yazid enviou um enorme exército para cercar e matar todos os integrantes da caravana. O imã Hussain iria morrer por “se meter” no combate à corrupção do governo de Yazid, neto  de Abu Sufia e  filho de Muwaia,  aos quais o profeta   amaldiçou, pois Abu Sufia liderou várias lutas contra o islã e era idólatra.

“Matem Hussain, mesmo que esteja agarrado às cortinas da Caaba”, ordenou.

O imã sai com seus seguidores de Meca. Ele olha para sua caravana ao partir e diz: “Somos de Alá e a ele retornaremos.”

O que aconteceu depois no cerco à caravana do imã Hussain toca os corações de todos que tem algum valor revolucionário.

Há muitas narrativas sobre a batalha em Carbala, uma região desértica na qual a caravana foi cercada em emboscada e privada de acesso ao único rio nas imediações. Pereceram de sede.

Durante nove dias no deserto, sem água para beber, o exército de Yazid somava 30 mil mercenários (ou 70 mil homens, conforme algumas versões) para atemorizar e matar a família do profeta e  um núcleo de crentes do  islã, cruelmente assassinados  na decima noite do mês de Muharram. Foram  decapitados e suas cabeças levadas em uma procissão macabra. Todas as mulheres foram feitas prisioneiras .

Zainab, irmã de Hussain,  discursou contra a tirania e a opressão em cada lugar que foi acorrentada e arrastada até sua prisão na Síria.

A cabeça de Hussain foi levada em uma  procissão em uma  estaca. Diz a história que Yazid obrigou a filha menor do imã, Sukaina, a assistir a todas estas barbaridades. Ela desmaiou ao ver a cabeça de seu pai martirizado.

Os métodos cruéis se parecem muito aos ainda hoje utilizados pelos mercenários do grupo terrorista Estado Islâmico, que não tem nada a ver com o islã ou com a luta revolucionaria alguma.

Todos os anos, nesta época  do calendário islâmico, relembramos as dez noites de Muharram e Ashura e nos reunimos para lamentar a morte do imã Hussain e de sua caravana abençoada em mesquitas e centros islâmicos da escola xiita.

Choramos por eles, pois são os nossos mártires. Choramos como se fosse recente e vestimos negro em sinal de luto.

As lições de Carbala são muitas e muito fortes até hoje para nós .

 Mais de 25 milhões de fiéis se reúnem em peregrinação a Carbala todos os anos para recordar a batalha. O número tem aumentado continuamente.

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