Diálogos da Fé

Blog dedicado à discussão de assuntos do momento sob a ótica de diferentes crenças e religiões

Diálogos da Fé

Desde um Caicó arcaico onde nem tudo é descrença e nem tudo é fé

Dom Antônio transpassou as fronteiras do Seridó e do catolicismo para inspirar esperança e fé em quem se mantém coerente ao projeto de Cristo

Desde um Caicó arcaico onde nem tudo é descrença e nem tudo é fé
Desde um Caicó arcaico onde nem tudo é descrença e nem tudo é fé
Dom Antônio transpassou os clichês da “tolerância” ao “diferente”, de “acolher o pecador e não o pecado”
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Tomo emprestado da Prosa impúrpura do Caicó, de Chico César, alguns de seus belos e geniais versos para com eles saudar o profetismo e a coragem de Dom Antônio Carlos Cruz Santos.

No coração do Seridó Nordestino – em uma época em de tanta descrença na humanidade, nas ideologias conservadoras e reacionárias e, sobretudo, nas estruturas e doutrinas religiosas que sustentam desigualdades, preconceitos e discriminação – um bispo negro adentra nosso peito catolaico com sua mensagem vital e contundente a respeito da homoafetividade.

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No dia 30 de julho, Dom Antônio discursou para centenas de fiéis na missa de encerramento da Festa de Sant’Ana, padroeira da Diocese de Caicó, no Rio Grande do Norte. Sua prédica, assim como a figura do Cristo transpassado utilizada por ele, foi muito além da celebração: transpassou as fronteiras do Seridó e do catolicismo para inspirar esperança e fé nas pessoas que se mantêm coerentes ao projeto de Cristo.

Com sua assertiva “homoafeticidade é dom de Deus”, o bispo também transpassa os clichês da “tolerância” ao “diferente”, de “acolher o pecador e não o pecado”, de respeitar desde que afetos não sejam “demonstrados em público”, entre outras locuções de um catolicismo arcaico que ainda não reconhece a diversidade como a verdadeira natureza humana.

Transpassa uma visão puramente magnânima para o entendimento de que todas as orientações sexuais são igualmente legítimas e sagradas. Nos desafia a sermos a “boa nova” para superar a rigidez da cultura católica, nos provocando a dar “um salto na perspectiva da fé e a superar o preconceito contra nossos irmãos homoafetivos”.

Afirma o bispo que “se não é escolha, se não é doença, na perspectiva da fé só pode ser um dom, é dado por Deus. Dom é isso. É dado por Deus, não tem jeito. Mas talvez os nossos preconceitos não consigam perceber o dom de Deus.”

De fato, a cegueira do preconceito não tardou em se manifestar em nome de uma pretensa fé por meio de ofensas e palavras de ódio contra o que consideram pecado, contra o bispo e todas as pessoas que comungam de suas ideias.

Um ódio contra pessoas que simplesmente defendem o direito de existir, de amar e receber amor, de ter sua dignidade respeitada. Em nome da “fé”, constroem o “inferno” que desejam aos que não se encaixam em sua moral excludente.

Cristo, por sua vez, não pregou nenhuma moral, nem fundou religião alguma. Ele foi o anúncio encarnado de uma nova ética fundada no amor ao próximo, na solidariedade; uma concepção tão radical e revolucionária pela qual foi perseguido, torturado e morto.

Ele não foi o único. Muitas pessoas vieram antes, junto e depois dele, anunciando e vivendo essa ética. Dom Antônio também não está sozinho em sua perspectiva da fé: com este mesmo espírito, seguimos com o nosso peito catolaico aberto, com a descrença necessária em tudo que oprime, discrimina e mata, e com a fé no humano capaz de transformar tudo isso.

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