Intervozes

Congresso elege empresários para vagas da sociedade civil em Conselho

Decisão de Eunício Oliveira colocou radiodifusores e diretor da Claro em assentos da sociedade civil no Conselho de Comunicação Social do Parlamento

Congresso elege empresários para vagas da sociedade civil em Conselho
Congresso elege empresários para vagas da sociedade civil em Conselho
Sessão do Congresso no dia 13 de julho: Eunício Oliveira aprovou sua lista de empresários para o CCS
Apoie Siga-nos no

Há dois anos, a escolha para os representantes do Conselho de Comunicação Social – órgão consultivo do Congresso Nacional – foi feita, inexplicavelmente, numa sessão sem quórum. Sem qualquer justificativa cabível, 13 membros titulares e 13 suplentes foram “eleitos” numa sessão conjunta da Câmara e do Senado que sequer poderia ter deliberado sobre qualquer tema.

À época, organizações da sociedade civil e a Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito à Comunicação (FrenteCom) questionaram a manobra no Supremos Tribunal Federal (STF). Mas os ministros preferiram não agir e permitiram que os novos conselheiros tomassem posse.

Sabendo deste risco e do histórico de ocupação das vagas destinadas à sociedade civil no CCS por empresários ou membros do governo – em 2015, na eleição fajuta, além de empresários, dois ministros foram designados para essas vagas, Aldo Rebelo e Henrique Eduardo Alves, hoje preso –, o movimento pela democratização da comunicação trabalhou, desde o início do ano, para evitar outro golpe.

Via FrenteCom e também dentro do próprio CCS, por iniciativa da representação dos trabalhadores da comunicação dentro do órgão, propôs critérios para a definição da representação da sociedade civil no órgão.

Isso porque a lei que instituiu o Conselho (Lei 8389/1991) determina que ele deve ser composto por três representantes de empresas de rádio, televisão e imprensa escrita; um engenheiro especialista na área de comunicação social; quatro representantes de categorias profissionais da comunicação e cinco representantes da sociedade civil. Não traz, porém, nenhuma definição de quem podem ser os indicados para ocupar este último setor, deixando o caminho aberto para a ocupação indevida das vagas por aqueles que já têm sua representação garantida.

Num contexto em que não há qualquer transparência em como a lista a ser apresentada para os parlamentares é construída, cabendo a palavra final sobre os nomes exclusivamente ao presidente do Congresso, as manobras se multiplicam.

No último dia 3 de julho, porém, em comum acordo entre empresários, trabalhadores e quem atualmente representa a sociedade civil no órgão, o CCS aprovou uma recomendação à Mesa Diretora do Congresso.

O texto orientava o Congresso para que as vagas da sociedade civil, na próxima gestão do CCS, fossem ocupadas por nomes indicados por organizações/instituições de âmbito nacional que, comprovadamente, atuem na área de comunicação; por instituições de pesquisa sobre comunicação; organizações que representam fundações que atuem na comunicação social e não estão representadas nas vagas destinadas às empresas privadas; por organizações de âmbito nacional que, reconhecidamente, representem segmentos expressivos da sociedade, como mulheres, negros e jovens, rádio ouvintes, telespectadores, leitores, internautas, dentro outros; e por instituições de âmbito nacional que, comprovadamente, atuem no campo jurídico.

Mas, novamente, a lista submetida à votação dos parlamentares pela Mesa do Congresso ignorou o princípio de composição tripartite do CCS, assim como as recomendações do próprio Conselho, e incluiu quatro empresários nas vagas da sociedade civil: Fábio Andrade, diretor da America Móvel, da Claro, indicado pelo próprio presidente do Senado, Eunício Oliveira; Ranieri Bertolli, presidente da Associação Catarinense de Emissoras de Rádio e Televisão; Luiz Carlos Gryzinski, diretor da Associação Brasileira de TV por Assinatura UHF (ABTVU); e Patrícia Blanco, representante do instituto empresarial Palavra Aberta, indicada pelo Conar, o Conselho de Autorregulamentação Publicitária, formado apenas por agências privadas.

A votação, realizada tarde da noite na sessão do Congresso da última quinta-feira 13, demorou menos de um minuto e o único partido em plenário que questionou a lista foi o PSOL.

Em nota divulgada na sexta-feira 14, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), que reúne 470 entidades nacionais e estaduais que defendem esta agenda, e que nunca esteve representado no CCS, acusou o Congresso Nacional de usurpar o direito de participação da sociedade civil no Conselho.

“Com essa prática, o Congresso não apenas veta a legítima e representativa participação da sociedade civil no órgão como garante dupla representação para setores empresariais no CCS, já que estes já tem suas vagas previstas em Lei. A supremacia do setor privado na composição CCS impedirá, assim, uma vez mais, que o interesse público prevaleça nas recomendações e debates do Conselho”, afirma o FNDC.

Como se vê, a relação promíscua entre empresários da comunicação e parlamentares não se limita àqueles que controlam diretamente emissoras de rádio e televisão e que, no dia a dia do Parlamento, legislam em causa própria. Ela passa pela ocupação de todo e qualquer espaço possível de favorecimento do mercado. No caso específico do CCS, silenciando a sociedade civil em seu único espaço de representação institucional nacional para o tema.

ENTENDA MAIS SOBRE: ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Depois de anos bicudos, voltamos a um Brasil minimamente normal. Este novo normal, contudo, segue repleto de incertezas. A ameaça bolsonarista persiste e os apetites do mercado e do Congresso continuam a pressionar o governo. Lá fora, o avanço global da extrema-direita e a brutalidade em Gaza e na Ucrânia arriscam implodir os frágeis alicerces da governança mundial.

CartaCapital não tem o apoio de bancos e fundações. Sobrevive, unicamente, da venda de anúncios e projetos e das contribuições de seus leitores. E seu apoio, leitor, é cada vez mais fundamental.

Não deixe a Carta parar. Se você valoriza o bom jornalismo, nos ajude a seguir lutando. Assine a edição semanal da revista ou contribua com o quanto puder.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo