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Gilmar Mendes, de apoiador a vítima do Estado de Exceção

O ministro do Supremo Tribunal Federal vira alvo do Ministério Público e sofre reprimendas da Globo. No Brasil, prova-se, a farsa se repete como farsa

Mendes: de herói a vilão da conspirata
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Os personagens deste enredo esqueceram as lições da História. Esqueceram que as tragédias se repetem como farsa. Ou, no caso do Brasil, que a farsa se repete como farsa. Exatamente como no passado recente, apoiadores de primeira hora de golpes e do Estado de Exceção tornam-se vítimas do próprio processo que estimularam. O maior exemplo, no século XX, foi o jornalista Carlos Lacerda, conspirador-mor, artífice do golpe de 1964 na esperança de ser conduzido ao poder sem a necessidade de apoio popular. Lacerda não alcançou o Palácio do Planalto como tramava. Acabou perseguido pelos militares a quem aplaudia e incentivava a colocar os tanques nas ruas. Os atuais Lacerda atendem pelo nome de Reinaldo Azevedo e Gilmar Mendes.

Lembremos antes o jornalista. Longe de ter o talento e a inteligência de Lacerda, Reinaldo Azevedo emergiu ainda assim como o grande guia das hostes fascistóides na internet. Perseguiu adversários políticos, estimulou o ódio e a insensatez e terminou consumido pela ignorância da turba despertada por ele mesmo. Bastou demonstrar um mínimo de racionalidade para ser arrastado sem piedade até a lama. As críticas aos métodos da Operação Lava Jato não foram perdoadas. Um áudio irrelevante de uma conversa sua com Andreia Neves, irmã presa do senador tucano Aécio Neves, vazado de forma criminosa por agentes públicos, custou-lhe dois empregos e uma situação embaraçosa. Tão grave, embora infinitamente menos relevante para os desígnios do Brasil, quanto os vazamentos ilegais autorizados pelo juiz Sergio Moro dos diálogos entre Lula e a ex-presidenta Dilma Rousseff e entre parentes do petista – vazamento que o jornalista aplaudiu à época.

Azevedo, de menor importância, é carta fora do baralho. O alvo do momento, e de maior peso, é o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal. Mendes sempre agiu como um militante do PSDB na Corte. Sua defesa do Estado do Direito em geral esteve ou está relacionada à proteção das forças políticas e econômicas que representa. Quando a Lava Jato se concentrava exclusivamente no PT e em Lula, o magistrado não só deixou o barco correr solto. Apoiou abertamente os esbirros autoritários. Tornou-se por extensão um herói dos movimentos a favor do impeachment. No caso dos vazamentos das conversas entre Lula e Dilma, não viu problemas na liberação em si dos áudios. Preferiu tripudiar do teor do diálogo entre o ex-presidente e então ocupante do Palácio do Planalto. Não só. Uma liminar de Mendes impediu a posse de Lula como ministro da Casa Civil, o que poderia ter salvado o mandato da petista. O ministro conspirou.

Quanto mais a investigação se aproximava do PSDB, mais Mendes mudava de rota e aumentava o tom das críticas à força-tarefa. Em sequência, comprou briga com o procurador-geral, Rodrigo Janot, e espinafrou os procuradores e delegados envolvidos na operação. A reação não tardou. Primeiro, modus operandi clássico da “República de Curitiba”, vazaram áudios que expuseram sua atuação facciosa, a favor dos tucanos, no STF.

Agora surgem informações de que a família do ministro, proprietária de terras no Mato Grosso, fornece bois aos frigoríficos da JBS. Não bastasse, sua intenção declarada de debater em plenário os termos da delação dos irmãos Batista, donos da Friboi, e de rediscutir a decisão do próprio Supremo de permitir prisões a partir de uma decisão de segunda instância mereceu críticas de um editorial de O Globo. Sinal que não deve ser ignorado. Como ressaltou em vários artigos o professor João Feres Júnior, criador do Manchetômetro e colunista do site de CartaCapital, a Globo é hoje o principal poder da República e reverbera os interesses do “partido da Lava Jato”. Muitos admiradores de Mendes passaram a defender seu impeachment. De herói a vilão em um passe de mágica. Se não tomar cuidado, o ministro será sugado pelas trevas.

PS: um ano depois, a revista Veja reconhece os excessos da Lava Jato no caso do vazamento dos áudios entre Lula e Dilma e denuncia a existência de um “Estado Policial”. Sinal de que o vale-tudo reina nas hostes que apoiaram a derrubada de Dilma Rousseff. Comprova-se o argumento de CartaCapital, exposto ainda em 2015: o impeachment seria um salto no escuro que destruiria o País.

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