Cultura
À luz da metrópole
Estudo recupera a sintonia de cineastas com São Paulo
São Paulo Cidade Azul
Andréa Barbosa
Alameda, 256 págs., R$ 53
Num momento em que o cinema nacional se ressente da ausência do frescor e pouco se constata o original, pode ser atraente voltar os olhos a um período no qual se exercitou plenamente a experimentação. É o que faz a antropóloga Andréa Barbosa em seu livro São Paulo Cidade Azul, se não exatamente com esse intuito, por certo assinalando que determinada produção ainda suscita interesse e mantém valor de investigação. E que material é esse? Como requer o subtítulo, trata-se de ensaios sobre as imagens da cidade no cinema paulista dos anos 1980. Uma ampla abordagem, como se poderia imaginar, que a estudiosa reduz a um núcleo de sete filmes cujos realizadores consolidaram posturas novas e mais libertas do fazer cinematográfico e tornar-se uma espécie de grupo aparentado de mesmo pensamento e interesses.
Quem se motivar para além de certa linguagem acadêmica encontrará na análise da professora da Universidade Federal de São Paulo uma relação dessa turma egressa da USP e das produtoras do bairro de Vila Madalena com o cenário urbano que os cercava. Assim se configura uma metrópole imponente de arranha-céus, neóns e tipos solitários dos filmes de Wilson Barros (Disaster Movie, Diversões Solitárias e Anjos da Noite), do submundo e marginal de Chico Botelho (Cidade Oculta) ou “onírica, com personagens extraídos de um imaginário noir norte-americano”, no caso de Guilherme de Almeida Prado com A Dama do Cine Shangai.
Quase sempre noturna, aponta-se, a cidade desses exemplos contrasta com a situação de mulheres comuns, não anônimas, da periferia em Anjos do Arrabalde, de Carlos Reichenbach, único veterano estudado a não integrar
a jovem turma. Por fim, a especificidade de Wholes, curta-metragem talvez dos mais radicais na pesquisa do período, assinado por A. S. Cecílio Neto, se dá pela mescla de ficção e documentário, de “narrativa não linear” que “reconstrói São Paulo a partir de seus buracos”.
A partir desse painel, Andréa apresenta conceitos que fundamentam uma aproximação dos filmes, a começar pelo que dá título ao livro, com base nas “imagens que mostram uma cidade ambivalente e amante do jogo cênico entre luzes e sombras”.
Enfim, o azul que se depreende da fotografia noturna na maioria deles. Avançará para enquadramentos específicos da discussão, como a ideia da memória relacionada a edifícios e monumentos de referência, a condição da cidade e seu centro como cenário predileto, a imposição de circular por ela de alguma maneira. Termina por questioná-la em sua existência única, sua personalidade, posturas que tantos realizadores não fizeram conta. Preferiram apenas filmá-la em homenagens que a autora aponta nos capítulos introdutórios, em clássicos como São Paulo S/A.
São Paulo Cidade Azul
Andréa Barbosa
Alameda, 256 págs., R$ 53
Num momento em que o cinema nacional se ressente da ausência do frescor e pouco se constata o original, pode ser atraente voltar os olhos a um período no qual se exercitou plenamente a experimentação. É o que faz a antropóloga Andréa Barbosa em seu livro São Paulo Cidade Azul, se não exatamente com esse intuito, por certo assinalando que determinada produção ainda suscita interesse e mantém valor de investigação. E que material é esse? Como requer o subtítulo, trata-se de ensaios sobre as imagens da cidade no cinema paulista dos anos 1980. Uma ampla abordagem, como se poderia imaginar, que a estudiosa reduz a um núcleo de sete filmes cujos realizadores consolidaram posturas novas e mais libertas do fazer cinematográfico e tornar-se uma espécie de grupo aparentado de mesmo pensamento e interesses.
Quem se motivar para além de certa linguagem acadêmica encontrará na análise da professora da Universidade Federal de São Paulo uma relação dessa turma egressa da USP e das produtoras do bairro de Vila Madalena com o cenário urbano que os cercava. Assim se configura uma metrópole imponente de arranha-céus, neóns e tipos solitários dos filmes de Wilson Barros (Disaster Movie, Diversões Solitárias e Anjos da Noite), do submundo e marginal de Chico Botelho (Cidade Oculta) ou “onírica, com personagens extraídos de um imaginário noir norte-americano”, no caso de Guilherme de Almeida Prado com A Dama do Cine Shangai.
Quase sempre noturna, aponta-se, a cidade desses exemplos contrasta com a situação de mulheres comuns, não anônimas, da periferia em Anjos do Arrabalde, de Carlos Reichenbach, único veterano estudado a não integrar
a jovem turma. Por fim, a especificidade de Wholes, curta-metragem talvez dos mais radicais na pesquisa do período, assinado por A. S. Cecílio Neto, se dá pela mescla de ficção e documentário, de “narrativa não linear” que “reconstrói São Paulo a partir de seus buracos”.
A partir desse painel, Andréa apresenta conceitos que fundamentam uma aproximação dos filmes, a começar pelo que dá título ao livro, com base nas “imagens que mostram uma cidade ambivalente e amante do jogo cênico entre luzes e sombras”.
Enfim, o azul que se depreende da fotografia noturna na maioria deles. Avançará para enquadramentos específicos da discussão, como a ideia da memória relacionada a edifícios e monumentos de referência, a condição da cidade e seu centro como cenário predileto, a imposição de circular por ela de alguma maneira. Termina por questioná-la em sua existência única, sua personalidade, posturas que tantos realizadores não fizeram conta. Preferiram apenas filmá-la em homenagens que a autora aponta nos capítulos introdutórios, em clássicos como São Paulo S/A.
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