Economia

Em audiência pública, senadores cobram punição por fraude bilionária na Americanas

A sessão da Comissão de Assuntos Econômicos contou com representantes da companhia, do sistema financeiro e de órgãos de controle

Foto: Lula Marques/Agência Brasil
Apoie Siga-nos no

Senadores cobraram nesta terça-feira 28 a punição dos responsáveis pela fraude contábil estimada em mais de 20 bilhões de reais nas Americanas. O rombo foi tema de uma audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos, que contou com representantes da companhia, do sistema financeiro e de órgãos de controle.

Na sessão, o senador Otto Alencar (PSD-BA), que sugeriu o debate, criticou a atuação da empresa de auditoria PricewaterhouseCoopers. Convidada para a audiência pública, a companhia não enviou representantes.

“É um atestado de que errou na auditoria de uma empresa tão importante, que empregava tantas pessoas. A Price fez uma maquiagem na contabilidade das Americanas”, disse o parlamentar. “Perdoe o termo mais duro, mas foi uma empresa bandida nesse caso. Maquiou toda a contabilidade. Se teve fraude, a Price está envolvida na fraude.”

Otto Alencar apresentou na segunda-feira 27 um projeto de lei a prever medidas de proteção ao sistema financeiro contra fraudes contábeis. O texto defende punir dirigentes de empresas de auditoria caso seja comprovada negligência ou imperícia no exercício da função.

O atual diretor-executivo das Americanas, Leonardo Pereira, reconheceu que a dívida “é bastante grande”, mas disse que a intenção inicial seria pagar os débitos com pequenos credores. Dos 9,5 mil credores incluídos no plano de recuperação judicial, 4,5 mil são trabalhadores da empresa ou micro e pequenas empresas.

“A gente tentou retirar aqueles credores menores, que são muito machucados nesse processo”, afirmou na sessão. “A companhia começou a pagar. Mas veio o recurso de um banco, pedindo para suspender os pagamentos. De 240 milhões de reais, a gente pagou 120 milhões para esses credores.”

O presidente da comissão, senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), classificou como “inadmissível” o fato de a PwC “não perceber um rombo como esse”. Ele também demonstrou “estranheza” com o fato de os acionistas de referência das Americanas – os bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira – ainda não terem honrado os compromissos com os credores.

“Os acionistas majoritários, que eram referência de prosperidade para nós, empresários brasileiros, pessoas empreendedoras, que viraram livro, não colocaram a mão no bolso neste momento em que muitos estão agonizando e alguns tentando o suicídio. A recuperação judicial é desumana, com deságio de até 70% e parcelamento em 48 vezes.”

Também presente à audiência no Senado, o ex-presidente executivo da empresa Sérgio Rial disse que a gestão anterior, controlada por Miguel Gutierrez, criou dificuldades para a sucessão e a divulgação de informações sobre a real situação contábil.

Rial classificou Gutierrez como “centralizador”. Disse ainda que, entre setembro e dezembro de 2021, participou de 21 reuniões na empresa como consultor, mas que, apenas em janeiro, após assumir formalmente o comando da Americanas, foi informado por dois diretores sobre os problemas no balanço patrimonial.

“Não recebi algo no papel. Não recebi algo como se fosse um mapa. Extraía a conta-gotas as informações dia após dia. Não havia uma predisposição para explicar tudo que aconteceu. Nada disso”, alegou. “O que eu sabia é que a empresa tinha muito mais dívida bancária do que havia reportado. E o que eu não sabia: como conseguiram fazer isso durante tanto tempo e por quê?”

Durante a sessão, o senador Carlos Portinho (PL-RJ) questionou a conduta de Rial no caso. Segundo o parlamentar, o vínculo do gestor com a empresa começou em maio — quatro meses antes do que havia sido divulgado. Ainda de acordo com Portinho, nesse período Rial prestava serviços ao banco Santander, um dos credores da Americanas.

“Isso tudo me faz supor se essa recuperação judicial faz parte de um engendramento que começou em maio de 2022 e que agora permite a negociação de créditos com deságio, a separação da Hortifruti do ativo principal, que vai ser vendido ao mercado”, destacou Portinho. “É quase uma reestruturação judicial forçada da dívida da Americanas, em detrimento dos pequenos fornecedores para fazer uma rearrumação societária, onde os 3G [os acionistas de referência] não aportaram aumento de capital. Não posso admitir que os 3G são tão bobos que não perceberam esse rombo. Isso me traz muitas suposições.”

Após as declarações de Portinho, Sergio Rial negou “qualquer tipo de conflito” em sua contratação pela Americanas. O presidente da Comissão de Valores Mobiliários, João Pedro Barroso do Nascimento, no entanto, disse que o órgão não havia sido informado sobre o vínculo com a companhia desde maio de 2022. Segundo Nascimento, a CVM instaurou dois inquéritos e 12 processos administrativos para apurar o caso.

Nascimento avaliou que o episódio revela “uma inconsistência na lisura da prestação de informações” pela empresa. Ele classificou o caso como “emblemático, lamentável e gravíssimo”.

“A CVM não tolerará ilícitos no mercado de capitais. Se os processos demonstrarem que infrações ocorreram, todos os responsáveis serão devidamente responsabilizados com o rigor da lei. Um caso como esse não poderia acontecer e precisa de uma resposta à altura para que o mercado de capitais brasileiro continue se desenvolvendo.”

(Com informações de Agência Senado e Agência Brasil)

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Depois de anos bicudos, voltamos a um Brasil minimamente normal. Este novo normal, contudo, segue repleto de incertezas. A ameaça bolsonarista persiste e os apetites do mercado e do Congresso continuam a pressionar o governo. Lá fora, o avanço global da extrema-direita e a brutalidade em Gaza e na Ucrânia arriscam implodir os frágeis alicerces da governança mundial.
CartaCapital não tem o apoio de bancos e fundações. Sobrevive, unicamente, da venda de anúncios e projetos e das contribuições de seus leitores. E seu apoio, leitor, é cada vez mais fundamental.
Não deixe a Carta parar. Se você valoriza o bom jornalismo, nos ajude a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo