Economia

Um espaço para o agronegócio

Rui Daher, novo colunista de CartaCapital, vai discutir questões da agropecuária no Brasil e no mundo

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Nunca foi alta a densidade de notícias sobre agropecuária nas folhas diárias. Mesmo jornais dedicados à economia mostravam ser difícil arrumar matéria para aquela única página convencional. Secas e geadas eram vistas com alívio nas Redações. Ministros da Agricultura, nem tanto, corriqueiras suas trocas.

Na TV, fora o excelente e longevo Globo Rural, pouca coisa relevante ia às telas. Revistas especializadas, estas sim, sempre foram muitas e sem dificuldade para conquistar leitores e anunciantes. Aqui uma rural, outra ali do campo, acolá várias de prefixo agro.

E por que não haveria de ser assim? A persistirem circulando publicações dedicadas aos armamentos de guerra e halterofilismo, entendo que alfaces, caprinos, ovos de codorna e sementes oleaginosas deveriam merecer a mesma proeminência.

Incomodada com isso, por volta de três décadas atrás, a agropecuária pulou a cerca da fazenda e foi se amigar com o setor industrial e o de serviços.

Desse ménage à trois nasceu o agronegócio, um caso estranho de dupla paternidade. Fato é que o rebento veio bem mais robusto do que a caboclinha que deixara a bucólica casa grande, média ou pequena, conforme mais tarde a fujona seria identificada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Sem exclusividade, pois deslumbres e desnorteios neoliberais só protegem os rentistas, depois de ter padecido agruras durante as décadas perdidas pela economia brasileira, hoje vai bem o agronegócio. Dizem representar um terço do PIB nacional.

Como é comum em filhos pobres que ganham importância agradecerem às suas mães, o rebento fez a caboclinha ser procurada pelos holofotes das folhas e telas cotidianas.

É o que me faz estar aqui em CartaCapital.

O dileto leitorado já deve ter percebido que, com raras exceções, o balaio de análises, opiniões, enfim, de referências à agropecuária chega a ele misturando ou contrapondo chiclete e banana, o que não é bom.

Celeiro do planeta, rainha da balança comercial, domínio tecnológico do Cerrado, põe veneno na saúva, muita terra a servir desimportantes rios, matas, pés de serra, índios e jacus.

Ou.

Concentrado em grandes propriedades, exportador de bens primários, pouco valor agregado, regiões quase monocultoras, caloteiros do Tesouro Nacional, todos para os orgânicos e agricultura familiar.

Já identificaram? Aí, ruralistas bancadas, confederações, associações, porta-vozes da indústria de insumos, organizações não governamentais, movimentos sociais, ambientalistas.

Que somos dados a Fla-Flu a política tem-nos mostrado à exaustão. No caso da agropecuária, seria melhor reunir os dois times e fazer uma boa seleção.

Quando se lamentou nossa vocação agrícola, o bonde da industrialização já estava passando. Para correr atrás melhor seria não estar abaixo do equador. Se aqui não há pecado, falta grana, o que fez os avançadinhos virem aqui atrás das muitas riquezas naturais. Deu no que deu.

Daí que começamos, também nós, a explorar o que Pero Vaz de Caminha fez ver Dom Manuel I: aqui se plantando tudo daria.

Não foi difícil. Nossos recursos naturais, relevo, dimensão territorial, clima, se juntaram a razoável processo setorizado de inovação tecnológica e proporcionaram invejáveis níveis de produtividade.

Tal construção se completou com atávica vocação de homens e mulheres para a atividade agropecuária, herança da colonização e dos ciclos econômicos que se sucederam.

Recentemente, cresceu a demanda mundial por alimentos, fibras e energia renovável, sobretudo puxada por China e índia, acima da oferta do hemisfério norte limitado pelos altos índices de produtividade já alcançados, escassez de terras agricultáveis e regulamentações mais rígidas.

Sobrou pra nós. Como um dia sobrará para a África.

Esta será a toada semanal por aqui.

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