A independência despercebida

O grito do Ipiranga não foi como a iconografia oficial o registra

Em vez do cavalo branco de Napoleão houve um muar - Imagem: Pedro Américo/Museu do Ipiranga/USP

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Na iconografia oficial, entregue ao pincel de ­Pedro Américo, Dom Pedro I monta o cavalo branco de Napoleão. Eu conheço outra versão do evento que se deu nas alturas do ­atual bairro do Ipiranga, então invadido por um renque de bananeiras. De verdade, a montaria era um modesto, paciente muar. Dom Pedro almoçara na vivenda da Marquesa de Santos, no litoral, e partira logo após sem maior alarde. Os frutos do mar propiciados pelos escravos cozinheiros provavelmente eram infiéis, ou seja, não muito católicos, e o jovem soberano subiu a serra acometido por uma crise intestinal.

Protegido pelas bananeiras do ­Ipiranga, ele atendeu às injunções indesejáveis para livrar-se do impiedoso incômodo desrespeitoso da linhagem do imperador. Não se sabe por que Dom Pedro vinha a São Paulo, mas o lugar da proclamação é mesmo aquele. E se houver um vilão neste entrecho antes de Pedro, convém citar o pai Dom João VI, aquele que nunca tomava banho e disso se gabava. Ocorre que, quando as tropas bonapartistas do general Junot se aproximavam de Lisboa, o rei embarcou e transferiu a capital do império lusitano para o Brasil, primeiro em Salvador e, finalmente, no Rio de Janeiro.

Em lugar do povo temos público, advertia Lima Barreto – Imagem: Miguel Schincariol/AFP

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1 comentário

PAULO SERGIO CORDEIRO SANTOS 11 de setembro de 2022 04h21
É realmente incrível como alguns historiadores deturpam a nossa história,e muitos alunos aprendem errado a história, dizem isso para dar um ar de heroísmo a personagens patéticos e falsidade diante dos acontecimentos que mudaram o rumo dos destinos do nosso país. Se o grito do Ipiranga foi fruto de um desarranjo intestinal de D. Pedro I e a independência foi um acaso do destino. O fato é que o povo negro trazido a força da África e o índio escravizado e morto covardemente por não obedecer à sanha assassina dos mamelucos bandeirantes foi a verdadeira realidade. D. João VI trouxe para o Brasil, junto com a corte portuguesa, fugitivo de Napoleão Bonaparte, o que de pior havia, dentre degredados, assassinos, estelionatários, falsários, corsários para colonizar a terra do pau brasil. Muitos se deitaram com as negras escravas a força que deram origem aos descendentes não reconhecidos, tidos como ilegítimos ou bastardos que deu origem ao povo brasileiro. Hoje vivemos num país em que muitos dos netos e bisnetos, trinetos e tetranetos desses enjeitados são os mesmos que aplaudem e se divertem das peripécias golpistas do capitão que governa o país. As instituições assistem atônitas ao espetáculo e às pantomimas de Bolsonaro e seus colaboradores num 7 de setembro marcado pela alegoria de um circo montado para ensaio de mais um golpe na república bananeira. Resta-nos torcer para que em 02 de outubro venha a redenção do país para tirar de cena, de uma vez por todas, aquele que mergulhou esse país num pesadelo que poderia levar a falência a própria nação festeira e resignada.

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