Ao atacar universidade, Bolsonaro visa uma juventude que lhe é hostil, diz Safatle

O professor da USP explica os anúncios de cortes no orçamento da educação no Brasil feitos pelo governo de Jair Bolsonaro

Marcos Santos/USP Imagens/Divulgação

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A revista francesa L’Obs traz em sua edição desta semana um artigo de opinião do filósofo brasileiro Vladimir Safatle. O professor da USP explica os anúncios de cortes no orçamento da educação no Brasil feitos pelo governo de Jair Bolsonaro e diz que as universidades do país se tornaram um alvo para o presidente.

Em texto de página inteira, o filósofo detalha as medidas anunciadas pelo governo, com destaque para o corte no orçamento das universidades federais e a intenção do chefe de Estado de suprimir alguns cursos de ciências humanas. “Ao reduzir as subvenções dos departamentos de filosofia e sociologia, o novo presidente visa uma juventude que lhe é hostil”, afirma Safatle.

 

No entanto, continua o texto, as medidas não são uma surpresa. “Dois dias após sua eleição Bolsonaro postou vídeos nos quais prometia menos política nas escolas, já mostrando que a luta contra a educação nacional seria uma de suas prioridades”.

Segundo o professor, ao atacar as instituições universitárias, “o Estado brasileiro aplica a política habitual dos governos de extrema direita”. Ele compara a situação atual do Brasil com o que aconteceu em países como Hungria e Turquia onde professores foram perseguidos e departamentos de faculdades fechados.

“Esses governos sabem que nunca terão o apoio do mundo universitário, pois é das universidades que vêm uma boa parte dos princípios que eles combatem”, continua o filósofo. “É ali que começa o desejo de mudanças e de renovação de conceitos como identidade, fronteira, origem e pertencimento, que estão no cerne do debate político”, insiste.


Mas Safatle lembra que o Brasil vive um momento particular, com uma transformação na composição das universidades do país na última década. “Atualmente, 51,2% dos estudantes das universidades federais são negros, 54,6% são mulheres e 70,2% tem uma renda média inferior a 1,5 salário mínimo”, explica.

Segundo ele, a universidade é um dos raros setores no qual os investimentos públicos foram realmente voltados para os mais pobres e mais vulneráveis. Mas essa evolução não corresponde ao que o regime Bolsonaro quer impor na sociedade, afirma.

De acordo com o filósofo, o governo Bolsonaro, formado por “militares nostálgicos da ditadura, representantes de uma elite econômica que valoriza a concentração de renda e a precariedade do trabalho e pastores evangélicos guiados por uma agenda conservadora”, se inspira no modelo implementado no Chile no final dos anos 1970, com “Augusto Pinochet e seus Chicago Boys”. E amordaçar as universidades públicas é o primeiro passo, conclui Vladimir Safatle nas páginas da revista L’Obs.

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