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O Irã entra de vez na mira do Estado Islâmico

Embora há anos combatam o EI na Síria e no Iraque, iranianos vinham sendo poupados de atentados em seu território

Policial iraniano gesticula na janela enquanto colega segura arma na janela do parlamento, durante ataque de 7 de junho
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Por Thomas Latschan

Os ataques armados de quarta-feira 7 em Teerã e cercanias visaram o coração da República Islâmica, tendo sido coordenados de forma profissional, seus alvos escolhidos com precisão. Vários homens invadiram o mausoléu do aiatolá Khomeini, 20 quilômetros ao sul da capital. Um deles se explodiu diante do prédio, os demais passaram a atirar a esmo. Uma segunda bomba foi desativada no interior do monumento.

Simultaneamente, no centro de Teerã, quatro outros atiradores penetraram nas dependências do Parlamento; segundo a mídia local, dois estavam disfarçados de mulher. Também aí se iniciou um tiroteio. Pelo menos dois deles se detonaram, os demais se entrincheiraram no edifício, travando uma batalha de horas com as forças de segurança iranianas.

Ao fim, pelo menos 12 pessoas morreram, inclusive quatro terroristas que foram abatidos, e 30 ficaram feridas. Uma mulher foi presa. Mais tarde, a milícia terrorista sunita “Estado Islâmico” (EI) reivindicou a autoria do duplo ataque.

Nova dimensão de terror

Caso a alegação se confirme, isso representa um novo nível de ameaça para o Irã: ao contrário do restante do Oriente Médio, até então o país vinha sendo poupado de atentados.

Enquanto a mídia estatal de Teerã tem sido ostensivamente contida ao noticiar sobre os incidentes, a Aamaq News, canal comunicativo não oficial do EI, divulgou, ainda durante os atentados, um vídeo de 24 segundos mostrando a invasão do Parlamento. Nele, dois dos invasores ameaçam o Estado iraniano, em idioma árabe.

É muito raro o EI propagar declarações ou filmes sobre atentados em curso, normalmente só assumindo a autoria a posteriori. No entanto, uma ofensiva contra o mausoléu de Khomeini tem peso simbólico fora do comum.

O líder religioso foi quem fundou, em 1979, a República Islâmica xiita, tão odiada e tachada de “herética” pelos jihadistas do EI. Como potência hegemônica sobre todos os xiitas do Oriente Médio, o Irã ocupa o topo da lista de inimigos dos extremistas sunitas.

Teerã participa ativamente do combate ao EI no Iraque e na Síria, apoiando as tropas governamentais em ambos os países. A mídia registra também o envolvimento de unidades especiais das brigadas iranianas Al-Quds em combates contra a organização jihadista.

Mas até então a milícia do EI não conseguira perpetrar nenhum atentado no território do Irã, apesar de todas as suas ameaças nesse sentido. Especialistas atribuem o fato à vigilância estreita a que a sociedade iraniana está submetida pelo serviço secreto estatal.

Ataques menores têm ocorrido, mas em geral atribuídos a grupos extremistas sunitas nacionais e quase exclusivamente fora dos grandes centros urbanos, de preferência em territórios de maioria sunita, como o Baluquistão, no extremo sudeste do país. O último grande atentado desse tipo já tem cerca de sete anos, quando uma explosão numa mesquita da região matou 39 pessoas.

Furando o bloqueio

Mesmo assim, é inegável que já há algum tempo o EI tem o Irã cada vez mais na mira. Em março último, apareceu nas redes sociais um vídeo de propaganda de 36 minutos em que um jihadista mascarado prometia subjugar o país e transformá-lo numa nação sunita. Também o sucessor de Khomeini, aiatolá Ali Khamenei, era ameaçado diretamente.

Desde a início dos combates no vizinho Iraque, tem-se repetidamente noticiado sobre choques entre soldados iranianos e extremistas sunitas que tentam penetrar no Irã. Em junho de 2016, o serviço secreto nacional informou que teria impedido uma série de 50 atentados, planejados por grupos extremistas ligados ao EI contra territórios densamente habitados, em todo o Irã. Na ocasião foram presos dez terroristas, e confiscados mais de 100 quilos de explosivos.

Funeral Iraniano chora durante funeral de vítima do atentado de 7 de junho (Foto: Atta Kenare / AFP)

Em novembro, um homem-bomba se detonou num posto de gasolina próximo à capital iraquiana, Bagdá. No local estavam estacionados sete ônibus do Irã, que retornavam de Kerbala, um dos principais sítios de peregrinação xiitas. Foram mortos cerca de 90 dos peregrinos, a maioria de nacionalidade iraniana.

Autoridades minimizam

Teerã procura trivializar ao máximo os atentados da última quarta-feira. Um comunicado da unidade antiterror iraniana diz que “diversos terroristas isolados” conseguiram entrar na capital, sem explicar de onde vieram. No entanto, foram “neutralizados”, acrescentam as autoridades.

O presidente do Parlamento, Ali Larijani, que se encontrava no prédio no momento do ataque, igualmente minimizou a gravidade do ataque: “terroristas covardes” teriam se infiltrado no complexo parlamentar, sendo detidos imediatamente. O assalto foi “um pequeno incidente”, mas que mostra como os terroristas “estão dispostos a criar problemas”.

Além disso, diversos representantes do governo iraniano acusaram a Arábia Saudita de estar por trás dos atentados. Há anos as relações entre Teerã e Riad são tensas, e agora chegaram a um ponto extremo, devido à atual crise diplomática em torno do Catar.

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