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Perguntas e respostas: crise imigratória na Europa

A resposta descoordenada e, por vezes, xenofóbica de governos europeus coloca a União Europeia no centro da crise

Criança chora enquanto migrantes e refugiados esperam para cruzar a fronteira entre Macedônia e a Grécia
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O mundo vive a maior crise de migatória de refugiados, por motivos de guerra ou perseguição política e étnica, desde a Segunda Guerra Mundial. Segundo a ONU, em 2014, 59,5 milhões de pessoas foram forçadas a abandonar seus países devido à violência. Neste ano, a expectativa é de um que número ainda maior.

Países com histórico recente de guerras lideram a lista dos que mais exportam refugiados. Em primeiro lugar vêm o Afeganistão, seguido pela Síria, Somália e Sudão, com o Iraque em sexto lugar. Nas últimas semanas, os refugiados têm se deslocado para a Europa, continente que apoiou intervenções militares no Afeganistão, Iraque e Síria. Leia, abaixo, algumas perguntas e respostas sobre o tema.

Por que muitos sírios estão deixando a Síria? 

A imensa maioria dos sírios que se dirige à Europa para escapar da guerra civil em seu país, iniciada em 2011, com a repressão imposta pelo ditador Bashar al-Assad às manifestações da chamada Primavera Árabe. Atualmente, diversas cidades sírias estão destruídas e o país se encontra dividido entre grupos pró-Assad, rebeldes anti-governo, forças curdas, o Estado Islâmico e outras facções jihadistas, entre elas a Frente al-Nusra, ligada à Al-Qaeda. 

A família do menino Aylan Kurdi, encontrado morto em uma praia turca, vinha de onde?

Desde 2011, mais de 4 milhões de pessoas deixaram a Síria, cerca de um quarto da população. Aylan Kurdi, o menino cuja fotografia comoveu o mundo, havia fugido com sua família de Kobane, cidade síria palco de violentos confrontos entre militantes do Estado Islâmico e forças curdas no início do ano.

Aylan Kurdi Guarda turco ao lado do corpo de Aylan Kurdy, encontrado morto próximo a cidade de Bodrum. Foto: AFP

Os países europeus são os que mais recebem sírios?

Não. Segundo a Anistia Internacional, 95% dos refugiados sírios estão em apenas cinco países: Turquia, Líbano, Jordânia, Iraque e Egito. A Turquia já recebeu cerca de 2 milhões de sírios e o Líbano, mais de um milhão. A explicação para isso é a proximidade. Diante de uma situação de guerra, os refugiados não têm muitas opções de fuga e optam pela rota mais fácil, que geralmente leva a países vizinhos. 

Por que os países ricos do Golfo Pérsico têm recebido poucos reugiados?

Os sírios não possuem livre tráfego para estes países. Oficialmente, eles podem solicitar um visto de turista ou permissão de trabalho, mas o processo é caro e há restrições veladas que dificultam a obtenção de vistos. Este posicionamento já foi criticado por organizações em defesa dos Direitos Humanos e não há perspectiva de mudança.

Ao mesmo tempo em que dificultam a entrada de refugiados sírios, países como Arábia Saudita, Catar e Emirados Árabes Unidos também são acusados por organismos internacionais de financiar grupos armados na Síria e manter a situação de guerra civil.

Cidadãos de quais outros países têm migrado para a Europa?

Além da Síria, cidadãos de outros países com violência constante ou em situação de grande pobreza têm sido obrigados a procurar refúgio na Europa. Segundo a Eurostat, órgão de estatísticas da União Europeia (UE), cidadãos sírios lideram a lista de pedidos de asilo, com 122 mil pedidos. Em seguida estão: Afeganistão (41 mil pedidos), Kosovo (37 mil), Eritrea (36 mil), Sérvia (30 mil) e Paquistão (22 mil).

Por que pessoas que procuram asilo na Europa estão sendo impedidas de embarcar em trens na Hungria?

Diante da chegada de um grande número de refugiados, o governo húngaro optou por impedi-los de acessar a estação central de trem de Budapeste, uma das vias para a Alemanha. O bloqueio era restrito apenas a refugiados. O governo húngaro se justificou dizendo que tentava cumprir as regras da União Europeia, que só permite o livre fluxo entre os países-membros para quem possuir passaporte europeu e visto de entrada. Além disso, a ação visava seguir a Convenção de Dublin, que estabelece que os candidatos a asilados façam o pedido no primeiro país da UE que entrarem.

Contudo, o bloqueio do governo não surtiu efeito e centenas de refugiados decidiram cruzar as fronteiras do país a pé. Diante disso, o governo húngaro cedeu. No dia 5, retirou os policiais da estação de trem de Budapeste e decidiu providenciar ônibus para levar os imigrantes até a fronteira com a Áustria. Diversos cidadãos alemães e austríacos também viajaram de carro até a Hungria para oferecer carona a quem pretendia se deslocar em direção a estes países.

Refugiados na Hungria Refugiados cercados pela polícia húngara nos trilhos próximos a uma estação de trem na fronteira da Hungria com a Sérvia. Apenas neste ano, a Hungria recebeu 160 mil pessoas que pretendiam acessar a União Europeia. Foto: AFP

Como os governos europeus estão reagindo à questão?

Não existe uma resposta unificada dos governos. Alemanha e Suécia, por exemplo, têm se mostrado receptivas aos refugiados. Por outro lado, Hungria e Reino Unido defendem um número limite de refugiados e políticas de deportação. Outros têm alertado refugiados que não estão preparados para recebê-los. Este é o caso do governo da Dinamarca, que publicou anúncios em três jornais libaneses pedindo para que eles não se dirijam para o país.

O bloco busca um entendimento sobre esta questão?

Sim. O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, pediu na quarta-feira 9 aos países da UE que recebam 160 mil refugiados e adotem ações “corajosas” para responder à mais grave crise migratória em décadas na Europa. Diante do Parlamento Europeu, Juncker disse que vai avançar com uma proposta que prevê a distribuição com “urgência” e com carácter “obrigatório” de mais 120 mil refugiados, além dos 40 mil já propostos, que hoje estão espalhados pela Hungria, Itália e Grécia. Conforme adiantou o jornal inglês Financial Times, a proposta irá prever multas para os países que rejeitem a sua quota. Segundo a ONU, a Europa deveria receber 200 mil refugiados.

Quais os países mais procurados pelos refugiados na União Europeia?

A maioria dos candidatos de asilados que chegaram à Europa nos últimos meses tem buscado países que pouco sofreram com a crise econômica, como Alemanha, Áustria e Suécia. Em 2014, os Estados-membros da União Europeia aceitaram 184 mil pedidos de asilo, segundo a Eurostat. O país líder na aprovação deste pedido é a Alemanha, com 47 mil pedidos aprovados, seguida por Suécia (33 mil), França (20 mil), Itália (20 mil), Suíça (15 mil) e Grã-Bretanha (14 mil).

Como resolver este problema?

Por definição, um refugiado é alguém que teve de deixar seu país natal por causa de sua etnia, religião, nacionalidade, convicção política ou pertencimento a certo grupo social, segundo a convenção de Genebra sobre refugiados. No caso dos refugiados sírios, por exemplo, a guerra civil é o principal motor da migração. Na Eritreia, por outro lado, a repressão e a perseguição política por parte do governo são as causas. Por isso, uma solução para a crise humanitária dos refugiados passa obrigatoriamente pela paz e estabilidade democrática nos países de origem.

Conflitos armados decorrentes da invasão do Iraque e Afeganistão, em países africanos ou pós Primavera Árabe respondem, em grande medida, pelo maior número de refugiados no mundo desde a Segunda Guerra Mundial. Segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), o número de deslocados e refugiados alcançou, em 2014, um recorde de 59,5 milhões de pessoas. Há uma década o número era de 37,5 milhões.

Como o Brasil tem se colocado diante da crise migratória?

Na segunda-feira 7, Dilma Rousseff disse que o Brasil está de “braços abertos para acolher refugiados”, apesar dos “momentos de dificuldade como o que estamos passando”. Desde o início da guerra civil até agosto deste ano, o Brasil já concedeu asilo a 2.077 sírios, segundo dados do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), órgão ligado ao Ministério da Justiça. Com isso, os sírios já representam 25% do total de refugiados no Brasil.

Este número é superior ao pedido de asilo de sírios aceitos por Estados Unidos (1.243) e países no sul da Europa, que recebem sírios vindos pelo Mediterrâneo. Segundo a Eurostat, entre os países europeus banhados pelo Mediterrâneo, a Espanha é a que mais aprovou solicitações de asilo, acolhendo 1.335 sírios. Em seguida, vêm a Grécia (1.275), Itália (1.005) e Portugal (15). Apesar de acolher um grande número de refugiados, o Brasil é criticado por oferecer poucas oportunidades para que eles consigam subsistir. “Eles têm grandes desafios para conseguir uma colocação profissional, moradia, mesmo que provisória, e ter acesso aos serviços públicos”, afirma Manuel Furriela, presidente da Comissão da OAB-SP para os Direitos dos Refugiados.

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