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Venezuela: em 40 dias de protestos, 38 mortos

Jovem de 27 anos foi assassinado em novo ato contra Maduro. Oposição adota bombas de fezes como arma

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Um jovem morreu na quarta-feira, 10, durante uma grande manifestação contra o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, em Caracas, elevando a indignação pela escalada de violência, que já deixou 38 mortos em 40 dias de protestos.

Miguel Castillo, de 27 anos, morreu em decorrência de um ferimento de arma de fogo, após participar da mobilização de milhares de opositores, que gerou intensos confrontos com policiais e militares. O ministro do Interior, Néstor Reverol, afirmou que investiga o fato.

Castillo morreu em Las Mercedes, uma zona comercial de luxo. Gerardo Blyde, prefeito de Baruta, onde fica Las Mercedes, denunciou a violência. “Miguel era filho da funcionária administrativa do governo municipal de Baruta. Exigimos justiça verdadeira, promotora”, manifestou-se o prefeito no Twitter, ao dirigir a mensagem à titular do Ministério Público, Luisa Ortega, chavista confessa, que tem se mostrado em desacordo com a ação das forças de segurança.

Vários manifestantes foram impactados pelas bombas de gás lacrimogêneo atiradas pelos militares e pelos policiais de caminhões blindados contra a marcha na principal rodovia de Caracas. “Assassinos! e “Estão nos matando!” – gritaram, entre lágrimas, várias pessoas no centro médico para onde foi levado o jovem, quando foi constatada sua morte.

Ao tomar conhecimento do falecimento, o secretário-geral da Organização de Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, condenou “a brutal repressão do regime”. Almagro vem transformando a OEA em um bastião de firme apoio à oposição venezuelano.

As manifestações, que exigem a saída de Maduro e a convocação de eleições gerais, começaram em 1º de abril, depois que o Tribunal Supremo Justiça assumiu temporariamente as funções do Legislativo, o único poder controlado pela oposição.

Bombas de fezes

A marcha desta quarta-feira tentava justamente chegar até a sede do Supremo, no centro de Caracas, mas a tropa de choque bloqueou o caminho e dispersou os manifestantes à base de bombas de gás.

Com escudos de madeira e metal e encapuzados, dezenas de jovens colocaram-se à frente da mobilização, atirando pedras, coquetéis molotov e bombas de tinta contra os militares. Alguns atiraram bombas de excrementos, as chamadas “puputov”. Durante a passeata, jovens entrevistados pela AFP explicaram que decidiram usar as bombas de fezes diante do “aumento da repressão” por parte das forças do governo.

Os “puputov” foram utilizados no fim de semana passado em um protesto em Los Teques, subúrbio de Caracas, após o qual se popularizaram nas redes sociais e se espalharam pelas ruas.

A multidão recuou depois de três horas, diante da intensificação das bombas e dos jatos d’água. “As pessoas resistiram, estamos aprendendo, foi difícil nos fazer recuar”, comentou à AFP Rodrigo Moscoso, de 43 anos.

Os opositores também repudiam a convocação de Maduro para uma Assembleia Constituinte popular, por considerar que com isso busca uma “Constituição à sua medida para se perpetuar no poder”. “A moral deste povo está mais firme do que nunca. Não vamos aceitar uma Constituição feita por Maduro e seus amigos”, afirmou o líder opositor Henrique Capriles, enquanto limpava com um lenço o resto do gás lacrimogêneo.

As passeatas têm como combustível o mal-estar popular gerado pela crise econômica, que atinge o país petroleiro, com uma severa escassez de alimentos e medicamentos e uma inflação que é a mais alta do mundo.

A situação gera preocupação internacional. Nesta quarta-feira, a OEA adiou para a segunda-feira a definição da data em que os chanceleres abordarão a crise, o que a chanceler venezuelana, Delcy Rodríguez, considerou uma derrota dos “países intervencionistas”.

Militarização 

A tensão aumentou esta semana com o julgamento de civis em tribunais militares, o que a oposição denunciou como uma manobra do governo para “criminalizar” e “desativar” os protestos. O governo ainda não se pronuncia sobre estes processos.

Segundo o diretor da ONG Fórum Penal, Alfredo Romero, 73 pessoas foram detidas, acusadas de rebelião por tribunais militares, sobretudo no estado de Carabobo (noroeste).

O Ministério Público pediu nesta quarta-feira que sejam julgados por tribunais civis e não militares 14 detidos em Rosario de Perijá (noroeste), onde um grupo de pessoas destruiu a estátua do falecido presidente Hugo Chávez (1999-2013) e tentou queimar a prefeitura.

“Se já militarizaram tudo, como não vão militarizar a Justiça? (…) Querem controle total”, afirmou o deputado opositor Henry Ramos Allup. Almagro qualificou a medida como uma “prática das ditaduras”.

Governo denuncia intervenção dos EUA

Nesta quinta-feira 11, o governo venezuelano acusou os Estados Unidos de financiar grupos violentos da oposição. “O financiamento e apoio logístico americano aos grupos violentos na Venezuela facilitaram uma insurgência armada”, denunciou a chancelaria, advertindo que esta insurreição terá uma resposta com a lei.

Em seu comunicado, o governo venezuelano assegurou que o apoio americano faz parte de uma trama para intervir no país com as maiores reservas de petróleo do mundo, incluindo um bloqueio financeiro internacional e declarações ameaçadoras de funcionários.

A chancelaria citou em particular o subsecretário interino de Estado para o Ocidente, Francisco Palmieri, que na última terça-feira criticou os planos de Maduro de reformar a Constituição como um mecanismo, segundo o presidente, para resolver a crise política.

Para Palmieri, com sua convocação a uma Assembleia Constituinte, Maduro busca “permanecer no poder”.

A chancelaria venezuelana sustentou que a “violência extrema e o vandalismo” das últimas semanas também se devem a decisões “intervencionistas” da OEA de Luis Almagro, que no mês passado denunciou uma ruptura da ordem constitucional.

Constituinte

Maduro, cujo governo é rejeitado por 70% dos venezuelanos, segundo pesquisas, assegura que as manifestações se degradaram em “atos terroristas” e focos de “insurgência armada”.

O presidente disse ter sido obrigado, então, a convocar uma Constituinte para reforçar a Constituição impulsionada por seu mentor, Chávez, e conseguir a reconciliação do país.

“Maduro deu um ‘baque’ na oposição com esta Constituinte. Não vão trazer o caos para cá”, disse o jovem Andrés Mejía, em uma concentração maciça de chavistas no centro.

No ato, Elías Jaua, delegado presidencial para impulsionar a Constituinte, a defendeu como o “caminho para a paz” diante da “violência da direita fascista”.

A oposição descarta participar da Constituinte, porque metade dos 500 constituintes serão eleitos entre setores controlados pelo chavismo, o que em sua avaliação nega o voto universal. Maduro afirma que será “popular” e não de “elites”. A Constituinte deixa em suspenso as eleições presidenciais de dezembro de 2018, e as votações para governadores (adiadas em 2016) e prefeitos (2017).

*Com informações da AFP

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