Justiça

Caso Marielle: Por unanimidade, 1ª Turma do STF torna réus os irmãos Brazão e o delegado Rivaldo Barbosa

A Corte ainda não analisou o mérito dos argumentos da PGR, mas concluiu haver indícios suficientes para instaurar as ações penais

Reprodução/ALERJ
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A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal aceitou nesta terça-feira 18 a denúncia contra os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão, o delegado Rivaldo Barbosa e outros dois acusados de participação no assassinato da vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco (PSOL). O crime aconteceu em março de 2018.

Com a decisão, os cincos suspeitos se tornam réus e responderão a ações penais. A denúncia foi apresentada pela Procuradoria-Geral da República no início de maio.

Os ministros não analisaram o mérito dos argumentos da PGR, mas entenderam que a acusação tem elementos suficientes para abrir as ações. As defesas dos envolvidos alegam que as conclusões da Polícia Federal são “frágeis”.

Relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes rechaçou enviar o processo sobre os mandantes do assassinato para as instâncias inferiores da Justiça. A manutenção do caso no STF, sustentou o magistrado, é essencial para assegurar a integridade e o rigor das investigações, considerando a natureza grave e as implicações políticas do crime.

O caso chegou ao Supremo em março deste ano, após as investigações constatarem o envolvimento de figuras com foro por prerrogativa de função na Corte. O entendimento de Moraes foi acompanhado integralmente pelos ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Cármen Lúcia.

Quem são os acusados?

  • Chiquinho Brazão é deputado federal pelo Rio de Janeiro e foi preso pela PF em 24 de março. Eleito pelo União Brasil, foi expulso do partido logo depois de ser preso sob acusação de encomendar o crime. É acusado pelos crimes de homicídio qualificado, com penas de 12 a 30 anos de prisão, e integração a organização criminosa, de 3 a 8 anos.
  • Domingos Brazão foi conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro e também está detido. Responde pelos mesmos crimes atribuídos ao irmão.
  • Rivaldo Barbosa chefiava a Polícia Civil do Rio quando as investigações sobre o caso Marielle começaram. A apuração apontou que ele utilizou o cargo para dificultar a elucidação do crime e garantir a impunidade dos irmãos Brazão.
  • Ronald Paulo de Alves Paula é major da Polícia Militar e apontado na denúncia da PGR como o responsável por acompanhar os deslocamentos de Marielle, inclusive por identificar que ela participaria de um evento na noite da execução.
  • Robson Calixto Fonseca, conhecido com Peixe foi assessor de Domingos Brazão no TCE do Rio. É acusado de ter fornecido a arma usada no assassinato.

De acordo com as investigações, o assassinato de Marielle começou a ser arquitetado pelos irmãos Brazão no segundo semestre de 2017. Os detalhes da trama foram revelados na delação premiada do ex-policial Ronnie Lessa, responsável pelos disparos que mataram a parlamentar e seu motorista Anderson Gomes.

Foi a colaboração do ex-PM que contribuiu para a elucidação do crime e a deflagração da Operação Munder Inc., responsável pela prisão de Chiquinho, Domingos e Rivaldo. As investigações apontaram que o crime ocorreu para proteger interesses econômicos de milícias e desencorajar atos de oposição política de Marielle.

Os detalhes da denúncia

Segundo a PGR, Domingos e Chiquinho trabalham desde o início dos anos 2000 para formar alianças com diferentes milícias no Rio. Os interesses a uni-los teriam relação com atividades de ocupação, uso e parcelamento irregulares de territórios.

Após traçar um longo panorama sobre a suposta trajetória criminosa dos irmãos, a Procuradoria afirma que eles tinham interesse econômico direto na aprovação de normas legais para facilitar a regularização do uso e da ocupação do solo em áreas de milícia e de loteamento clandestino.

Iniciativas do PSOL e, posteriormente, de Marielle contra essas práticas se tornaram, então, um problema para os Brazão.

Em 2015, o partido questionou a legalidade da eleição de Domingos para o TCE, sob os argumentos de haver vícios formais no procedimento e de que o indicado não tinha “notório saber jurídico”.

Ato contínuo, Domingos e Chiquinho teriam infiltrado um miliciano no PSOL, com o objetivo de reunir informações sobre a ação política dos correligionários.

Ao assumir o mandato de vereadora, em 2017, Marielle fez com que as pautas de interesse dos irmãos não prosperassem com a mesma facilidade, anotou a PGR. Ela defendia a regularização fundiária pela caracterização de Áreas de Especial Interesse Social, a fim de acolher segmentos de menor renda e, portanto, com maior déficit habitacional.

A denúncia ressalta que a vereadora passou a defender explicitamente que as iniciativas de Chiquinho visavam uma exploração econômica de espaços dominados por milícias. Em 2017, Marielle e o PSOL ofereceram grande resistência a um projeto articulado por ele, que acabou aprovado por apenas um voto além do mínimo necessário.

“Não há dúvida de que as dificuldades na tramitação do projeto e, sobretudo, o elevado risco de rejeição, somados ao histórico de conflitos com o PSOL e Marielle Francisco da Silva, recrudesceram o descontentamento dos irmãos Brazão”, diz a denúncia da PGR.

Marielle se tornou, portanto, a principal opositora e o mais ativo símbolo da resistência aos interesses econômicos dos irmãos”, pontua o relatório enviado ao STF. “Matá-la significava eliminar de vez o obstáculo e, ao mesmo tempo, dissuadir outros políticos do grupo de oposição a imitar-lhe a postura”.

No segundo semestre de 2017, Domingos e Chiquinho teriam ordenado a Edmilson Oliveira, o Macalé, que preparasse a execução de Marielle. Também teriam informado o plano a Rivaldo Barbosa, a fim de acertar a garantia de impunidade.

A PGR diz que Rivaldo encorajou a decisão e prestou auxílio intelectual aos envolvidos, inclusive com orientação sobre onde não deveriam cometer os assassinatos. À época, ele era diretor da Divisão de Homicídios da Polícia Civil. Um dia antes dos homicídios, tornou-se chefe da corporação.

Macalé, então, teria apresentado o plano e entregado uma arma ao ex-PM Ronnie Lessa, preso sob a acusação de disparar contra Marielle. Élcio de Queiroz dirigiu o carro usado no crime.

Edmilson também teria solicitado o apoio de Ronald, cuja função seria vigiar a rotina de Marielle e coletar informações úteis para o crime.

Segundo a PGR, os homicídios, por motivo torpe, ocorreram mediante promessa de recompensa por parte dos irmãos Brazão. A vereadora acabou assassinada a tiros na noite de 14 de março de 2018, no bairro do Estácio, centro da capital fluminense.

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