Ministério da Justiça tem 48h para explicar dossiê contra opositores de Bolsonaro

Decisão da ministra Cármen Lúcia diz que, se comprovada, investigação sigilosa 'escancara comportamento incompatível' com a democracia

A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal. Foto: Carlos Moura/SCO/STF

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A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu o prazo de 48 horas para que o ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, preste informações sobre a investigação sigilosa contra servidores antifascistas e professores críticos ao presidente Jair Bolsonaro. A decisão foi assinada nesta terça-feira 4.

A medida da magistrada responde a uma ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), movida pelo partido Rede Sustentabilidade em 27 de julho. O requerimento foi enviado à Corte após o portal UOL revelar que um órgão do Ministério da Justiça monitora 579 servidores federais e estaduais de segurança, supostamente ligados ao “movimento antifascismo”, e três professores universitários, por meio de um dossiê.

Para a Rede, o Ministério da Justiça se utiliza do “aparelhamento estatal para perseguições políticas e ideológicas”, sob a desculpa da atividade de inteligência. A legenda acusa a pasta de promover perseguição “a partir de uma bússola cujo norte é o governante de plantão: quem dele discorda, merece ser secretamente investigado e ter sua imagem exposta em dossiês ‘da vergonha’ perante suas instituições laborais”.

A sigla argumentou ainda que “há evidente violação a diversos preceitos fundamentais” previstos no artigo 5º da Constituição Federal, como a liberdade de expressão, o direito à intimidade, à vida privada e à honra, a liberdade de reunião e a liberdade de associação. Há ainda, para o partido, configuração de “desvio de finalidade” na prática do Estado, com a “confusão feita entre ‘interesse nacional’ e ‘interesse do presidente'”.

A Rede pediu a imediata suspensão da produção e disseminação de informações de inteligência estatal produzidos sobre integrantes do “movimento antifascismo”, e a imediata remessa ao STF sobre os conteúdos já produzidos. Além disso, pede que o Ministério da Justiça informe o conteúdo produzido entre 2019 e 2020, e explique o objeto dos conhecimentos e informações, o motivo da produção e seus destinatários.

 


Diante do exposto pela sigla, Cármen Lúcia escreveu que há “gravidade” no quadro descrito e destacou “comportamento incompatível” com os princípios da democracia. A magistrada também pediu urgência na tramitação do processo.

“A gravidade do quadro descrito na peça inicial, que – a se comprovar verdadeiro – escancara comportamento incompatível com os mais basilares princípios democráticos do Estado de Direito e que põem em risco a rigorosa e intransponível observância dos preceitos fundamentais da Constituição da República e, ainda, a plausibilidade dos argumentos expostos, pelos quais se demonstra a insegurança criada para os diretamente interessados e indiretamente para toda a sociedade brasileira impõem o prosseguimento da presente arguição de descumprimento, com tramitação preferencial e urgente”, diz a decisão.

Na segunda-feira 3, o ministro da Justiça demitiu Gilson Libório de Oliveira Mendes, chefe do órgão que monitorou os supostos integrantes do movimento antifascismo, a Diretoria de Inteligência da Secretaria de Operações Integradas (Seopi). Ele havia sido nomeado em 25 de maio. Em nota, o Ministério afirmou que instaurou uma Sindicância Investigativa para apurar os fatos.

Mendonça substituiu Sergio Moro no comando da Justiça, depois que o ex-juiz federal pediu demissão em 24 de abril. Ele ocupava a chefia da Advocacia-Geral da União (AGU).

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