Tropas avançam sobre Kiev, Putin pede ao exército para ‘tomar o poder’; o essencial do 2º dia de conflitos

A Defesa ucraniana pede que moradores atirem coquetéis molotov contra suspeitos; uma rede de TV chegou a veicular instruções de como preparar o artefato

FOTO: STRINGER/AFP

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O cerco das tropas russas a Kiev, capital da Ucrânia, marca o segundo dia da operação militar deflagrada pelo presidente Vladimir Putin contra o país vizinho. O Ministério da Defesa ucraniano informou que as forças da Rússia entraram no distrito de Obolon, a cerca de 10 quilômetros da Praça da Independência de Kiev, nas primeiras horas da manhã.

A ação em Obolon motivou a Defesa ucraniana a pedir que moradores relatem à Polícia a infiltração de russos no bairro e atirem coquetéis molotov contra suspeitos. Uma rede de TV chegou a veicular instruções de como preparar o artefato.

O jornal norte-americano New York Times noticiou que Kiev foi bombardeada com mísseis. Um foguete colidiu com um prédio residencial, sinal da intensificação de uma ação que se aproxima do coração do governo ucraniano.

Além disso, relata o veículo, forças ucranianas lutam contra as tropas russas nos arredores de Kiev. A chancelaria da Ucrânia ainda acusa as forças de Putin de atacar um jardim de infância e um orfanato, chamando a suposta ofensiva de “crime de guerra e violação do Estatuto de Roma”. A Rússia não confirma a alegação.

 

O ataque a Kiev começou com helicópteros, pouco antes das 4h pelo horário local (23h da quinta 24 em Brasília). Sirenes de ataque aéreo soaram sobre a cidade de três milhões de pessoas. Diante desse cenário, o prefeito de Kiev, Vitali Klitschko, anunciou que a capital “entrou em um nova fase, a de posicionamento defensivo, pronta para resistir também com o apoio de muitos cidadãos”.

Nos Estados Unidos, o governo de Joe Biden não esconde o receio de que a capital ucraniana caia nas mãos dos russos nos próximos dias.

Em meio a esse avanço das tropas, Putin pediu ao exército ucraniano para “tomar o poder” em Kiev e derrubar o presidente Volodymyr Zelensky e seu entorno, a quem chamou de “neonazistas e viciados em drogas”.

“Tomem o poder em suas mãos. Acho que vai ser mais fácil negociar entre vocês e eu”, instou Putin em um discurso transmitido pela TV.

Na noite ucraniana (pelo horário local), o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, afirmou que a aliança militar ocidental reforçará a presença de tropas no leste da Europa.

Além disso, a Força de Resposta da Otan foi ativada pela primeira vez como “medida defensiva”, em resposta à ação russa. A Força, sob a liderança do comandante supremo da aliança, o general Tod Wolters, é composta por contingentes terrestres, aéreos, marítimos e de operações especiais. Isso não significa, porém, que militares serão enviados para a Ucrânia, país que não compõe a Otan.

Segundo Stoltenberg, a Otan também continuará a enviar armas para a Ucrânia, inclusive para defesa aérea. Ele declarou, sem fornecer detalhes, que “alguns” dos 30 países que integram a aliança informaram o tipo de armamento que despachariam a Kiev.

 

Ações não se restringem a Kiev

Ataques persistem também em outras cidades da Ucrânia. Grandes explosões foram registradas em Kharkiv, a segunda maior do país. Em Lviv, sirenes de ataque aéreo soaram. Também há relatos de intensos combates em Sumy.


A leste de Kiev, os russos obtiveram um significativo avanço ainda na quinta-feira 24, quando assumiram o controle da usina nuclear de Chernobyl, o que sinaliza uma importante conexão entre as forças em Kiev e em Belarus, nação aliada do Kremlin que também entrou na mira de sanções do Ocidente por, supostamente, facilitar a operação russa contra a Ucrânia.

Em Chernobyl, a Ucrânia disse nesta sexta ter registrado índices preocupantes de radiação, “acima dos níveis de controle”. A avaliação é do vice-diretor do departamento ucraniano para questões de segurança em instalações nucleares, Alexander Grigorach, à agência à AFP.

Segundo Igor Konashenkov, porta-voz do ministério da Defesa russo, porém, não há motivo para preocupação. Ele diz haver, inclusive, cooperação entre soldados russos e ucranianos para garantir a segurança da usina, um sinal “de que as formações nacionalistas ou outras organizações terroristas não poderão usar a situação do país para organizar uma provocação nuclear”.

Nesta sexta, a Rússia afirmou que suas forças assumiram “com sucesso” o aeroporto militar de Hostomel, próximo a Kiev. Disse também que “não houve perdas” entre soldados russos e que “mais de 200 nacionalistas das forças especiais da Ucrânia foram mortos” durante a ação que levou à tomada de controle do aeroporto.

Como em qualquer guerra, as informações sobre mortes são difíceis de se verificar e variam consideravelmente de lado a lado.

Enquanto a operação militar escala com a chegada das tropas russas a Kiev, o Kremlin se diz pronto para negociar, desde que atendidas algumas condições. O governo Putin afirma buscar a “desmilitarização” e a “desnazificação” da Ucrânia, que deveria voltar a um status “neutro” – ou seja, longe dos tentáculos da aliança militar ocidental, a Otan.

O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, afirmou na noite desta sexta (horário local) que a Ucrânia “desapareceu” após concordar com o início de negociações – escolhendo, inclusive, a Polônia como local para as conversas.

Mais cedo, Zelensky publicou uma mensagem em vídeo dirigida a Putin: “Há combates em toda a Ucrânia agora. Vamos nos sentar à mesa de negociações para impedir a morte das pessoas”.

O governo russo anunciou a disposição de enviar uma delegação para as tratativas com a Ucrânia. A reunião de cúpula poderia acontecer em Belarus, segundo o Kremlin. Por lá, o presidente Alexander Lukashenko já disse a Putin que “criaria as condições” para o encontro.

Segundo Peskov, “o lado ucraniano disse que reconsiderou a ideia de realizar negociações em Minsk (capital de Belarus), escolheu Varsóvia e desapareceu”.

Zelensky reforçou nesta sexta que a Rússia o considera o “alvo número um”, a fim de “destruir politicamente” o país. Enquanto isso, a Ucrânia decidiu remover restrições etárias e simplificar ao extremo os procedimentos para que cidadãos se juntem às forças militares.

Um dos militares do governo disse, inclusive, que os ucranianos precisam apenas “de um passaporte e de uma identificação, sem limitações de idade”. Isso abre, por exemplo, margem à participação de menores de idade no conflito, já que, até aqui, apenas cidadãos entre 18 e 60 anos podiam se alistar ao Exército.


O governo ucraniano também alegou, nesta sexta, que mais de mil militares da Rússia foram mortos desde o início da operação militar, mas o Kremlin contesta e nega a afirmação.

Você também precisa saber:

  • O presidente chinês, Xi Jinping, se mostrou favorável nesta sexta 25 a uma resolução do conflito pela via diplomática. Segundo a estatal CCTV, que resumiu um telefone de Xi a Putin, a China “apoia a Rússia na resolução (do conflito) por meio de negociações com a Ucrânia”;
  • a União Europeia chegou a um acordo para impor sanções a Putin e a seu ministro das Relações Exteriores, Serguei Lavrov. O bloco poderia congelar bens ou ativos no espaço europeu
  • Peter Stano, um porta-voz da União Europeia, disse que Putin se comporta na Ucrânia “como os nazistas” e está prestes a cometer um genocídio;
  • o Papa Francisco foi à embaixada russa na Santa Sé para manifestar “sua preocupação pela guerra” na Ucrânia;
  • a ex-chanceler alemã Angela Merkel condenou o que chamou de uma “guerra de agressão” da Rússia contra a Ucrânia. Segundo ela, a operaçã marca uma “ruptura profunda na história europeia”.

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