Vaticano alerta contra episódios imaginários relacionados a milagres e aparições

Há dois meses, o Vaticano rejeitou como falsos os supostos milagres de uma imagem da Virgem Maria na pequena cidade de Trevignano Romano, a noroeste de Roma

Como sempre, na janela do Vaticano, a fala para a praça e para o mundo – Imagem: Osservatore Romano/AFP

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Da multiplicação de pizzas às lágrimas em imagens religiosas, o Vaticano atualizou, nesta sexta-feira (17), as regras relacionadas aos acontecimentos sobrenaturais, reconhecendo que episódios imaginários e “mentiras” podem prejudicar os fiéis.

As novas normas, publicadas pelo Dicastério para a Doutrina da Fé e aprovadas pelo papa Francisco, permitem uma interpretação mais moderada deste tipo de acontecimento.

“Em certas circunstâncias, nem tudo é preto ou branco”, disse o cardeal argentino Víctor Manuel Fernández, chefe do Dicastério, durante coletiva de imprensa.

“Às vezes uma possível reação divina se mistura (…) a pensamentos e fantasias humanas”, disse ele. A história da Igreja Católica está repleta de fenômenos estranhos ou inexplicáveis envolvendo estátuas religiosas ou objetos de todos os tipos.

Há dois meses, o Vaticano rejeitou como falsos os supostos milagres de uma imagem da Virgem Maria na pequena cidade de Trevignano Romano, a noroeste de Roma, que não só teria chorado sangue como teria aumentado o tamanho das pizzas.

As novas regras atualizam as que existiam desde 1978 e orientam os bispos, que até agora tinham liberdade para determinar a autenticidade das visões e aparições. Segundo o documento, o Vaticano “resolveu” apenas seis casos deste tipo desde 1950.


“Hoje chegamos à convicção de que estas situações complicadas, que causam confusão entre os fiéis, devem ser sempre evitadas”, indicou o cardeal Fernández no documento.

Maior colaboração entre dioceses e Vaticano

As novas regras exigem maior colaboração entre as dioceses e o Vaticano no caso de eventos deste tipo.

Além disso, a decisão final de reconhecê-los deverá ser aprovada pelo Dicastério, um passo crucial para evitar “crimes, manipulação de pessoas, danos à unidade da Igreja, benefícios econômicos indevidos, graves erros doutrinários, etc., que poderiam causar escândalos e minar a credibilidade da Igreja”.

Caso o acontecimento seja reconhecido com um “Nihil obstat” (“nada obsta”), “isso não implica uma declaração de autenticidade de possíveis fenômenos sobrenaturais”, observa o documento.

Os fiéis podem “aderir” à ideia de que se trata de um fenômeno sobrenatural, mas não vai haver uma declaração oficial de autenticidade, que no geral deve ser evitada sob as novas regras, a menos que seja autorizada pelo papa.

Para o cardeal argentino, a maioria dos grandes locais de peregrinação da Igreja se desenvolveram ao longo dos anos sem declaração oficial sobre a autenticidade do milagre original.

Nos casos mais graves, para evitar qualquer confusão ou escândalo, o Dicastério pedirá ao bispo local que declare publicamente que a crença no fenômeno não é permitida e que explique as razões desta decisão.

A Igreja, sublinha o Dicastério, deve reagir mais rapidamente, porque estes fenômenos “adquirem proporções nacionais e até globais”, devido à difusão nas redes sociais.

Os fatores a considerar são “a possibilidade de erros doutrinários, uma simplificação excessiva da mensagem do Evangelho ou a difusão de uma mentalidade sectária”.

Outros elementos incluem fiéis “enganados por um acontecimento atribuído à iniciativa divina, mas que nada mais é do que o produto da imaginação de alguém” ou de pessoas inclinadas à “mentira”.

Segundo o cardeal Fernández, é impossível saber a quantidade de eventos sobrenaturais que ocorrem a cada ano, já que a maioria é administrada pelas dioceses.

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