A Doutrina Monroe revivida

Uma nova onda progressista parece se formar na América Latina. Resta saber a reação do Tio Sam

Imagem: Biblioteca do Congresso dos EUA

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Desde a sua independência do colonialismo europeu, os países latino-americanos têm vivido uma história de relações atribuladas, tensas e desiguais com os Estados Unidos. A Doutrina Monroe, que estabeleceu a América Latina como uma zona de influência norte-americana, data de 1823. Desde então, todos os processos de maior autonomização, política ou econômica, em relação aos EUA contaram com a oposição desse país, o que envolveu interferências e violências de todo o tipo.

O corrente século conta já com uma experiência que, embora reflita o padrão, tem alguma novidade. A primeira ­década do século assistiu à emergência de governos progressistas como resposta à devastação social causada pelo neoliberalismo nas décadas anteriores. Nenhum deles implicou um corte com o modelo de ­desenvolvimento neoliberal, mas introduziram algumas restrições com a promoção de políticas sociais, que no ­Brasil foram bastantes amplas. A novidade consistiu em que estes governos não só prosperaram durante mais de uma década como lograram criar mecanismos de integração regional muito promissores ­(Alba, Unasur, Celac), livres da tutela do big brother e, no caso do Brasil, contribuíram para a criação de formas de integração global com vocação autonomista em relação a Washington, os BRICS. Esse momento luminoso começou a entrar em crise quando os Estados Unidos deram o primeiro sinal de desagrado pelo que se estava a passar com a promoção do golpe contra o presidente eleito de ­Honduras, ­Manuel Zelaya, em 2009. A partir de então, foram muitas as interferências, passando pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (2016), a Operação Lava Jato (2014-2021), a prisão de Lula (2017) e o golpe contra Evo Morales em 2019.

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2 comentários

MARCELO SPINOLA SARDINHA 27 de maio de 2022 19h34
Excelente texto!
PAULO SERGIO CORDEIRO SANTOS 21 de maio de 2022 05h17
O problema do neoliberalismo é todo esse dogma que impõem às pessoas como algo inevitável, inexorável e imutável, tudo para enganar e explorar o trabalho humano, como se a transformação tecnológica e avanços da ciência tivessem duas faces: uma boa que facilita a comunicação e a técnica e a má, que gera a destruição de postos de trabalho e reinserção das pessoas no novo cenário. O trabalhador acaba se sentindo culpado por estar alheio às novidades tecnológicas e se sente um ser descartável ou subutilizado. Alguns poucos usufruem desse descarte humano e das benesses que a acumulação do capital lhes proporciona. Ao invés de proporcionar um bem estar geral das populações, essas novas tecnologias lhes tiram o sono e a comida do prato. Quanto ás questão geopolítica, todos nós sabemos que os EUA lideram esse ideário neoliberal, senão são o próprio neoliberalismo personificado. Querem que comprem o que produzem e o que podem influenciar sob o ponto de vista ideológico. Agora com uma certa guinada política da América Latina à esquerda, resta o Brasil e a Colômbia, os EUA voltariam a interferir de novo, como fez com a Lava Jato ou o golpe contra Honduras de Manuel Zelaya. Incrível que ainda persistem a marginalizar países que estão andando com as próprias pernas como Argentina, Bolívia que derrotaram recentemente governos neoliberais e golpistas. O fato é que a Doutrina Monroe pode mesmo persistir se os povos latinos americanos não acordarem e não resistirem ao entorpecimento neoliberal de Tio Sam porque as elites de todos esses países venderiam as almas de seus povos e já se venderam bem antes da guerra de secessão.

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