Brasil: o coletivo-Gramsci

O otimismo da vontade não se pode confundir com a vontade do otimismo

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Foto: Ricardo Stuckert

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Em dezembro de 1929, Antonio Gramsci escrevia na prisão a que o fascismo italiano o confinara: “Não pensem que eu me sinto derrotado. Longe disso. Uma pessoa que está fortemente convencida da sua força moral, da sua energia e vontade e da necessária coerência entre fins e meios nunca se deixa abater por estados de espírito banais de otimismo ou de pessimismo. O meu estado de espírito é uma síntese desses dois sentimentos e transcende-os: a minha razão é pessimista, mas a minha vontade é otimista. Qualquer que seja a situação, eu imagino o pior que poderia acontecer e é isso que mobiliza toda a minha vontade e reservas de energia para evitar que isso aconteça e superar qualquer obstáculo”.

Imagino os democratas brasileiros neste momento como um Gramsci coletivo. Imagino-os a pensar com os seus botões o que pensava Gramsci em 1929 e a reagir do mesmo modo. Vejamos, pois, em que reside o pessimismo da razão e onde estão as reservas de energia para o otimismo da vontade. O pessimismo da razão decorre dos seguintes fatores. Primeiro, é difícil entender que, depois de quase 700 mil mortes por Covid, muitas delas evitáveis se não fosse a criminosa negligência do governo, do regresso massivo da fome que parecia erradicada, da degradação abissal do sistema científico e educativo, do desastre ambiental e humano intencionalmente produzido na Amazônia, do agravamento das desigualdades sociais e das condições de trabalho e dos sucessivos massacres da população das periferias, é ainda possível que 51 milhões votem em Bolsonaro. Tudo isso quando existia uma alternativa que trazia consigo a memória ainda recente de melhores tempos, memória também de uma exuberante presença protagonizada por alguém que regressava incólume do inferno a que injustamente o tinham condenado.

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1 comentário

PAULO SERGIO CORDEIRO SANTOS 17 de outubro de 2022 02h18
Percebemos que depois das eleições presidenciais de 2018 surgiu um tipo de eleitor ou cidadão ressentido que tem aversão às coisas democráticas e deseja viver num mundo a sua imagem e semelhança: toscos, preconceituosos, classistas, racistas, misóginos e Bolsonaro foi um líder que melhor os representou nesses anos, por isso essas pessoas voltaram a cena e não levaram em consideração o descaso com a pandemia e a negligência com os mortos pela COVID. Preferiram apoiar veladamente o ex capitão em suas investidas preconceituosas e seus discursos de ódio e de mentiras contra seus adversários políticos. Agora contra o ex presidente Lula. Antônio Gramsci disse que “viver quer dizer tomar partido. Não pode existir os que são apenas homens, estranhos à cidade. Quem vive verdadeiramente não pode não ser cidadão, assumir um lado, Indiferença é apatia, parasitismo, velhacaria, não é vida. Por isso odeio os indiferentes.” Assim, precisamos ter lado e o lado certo da história e da humanidade é ser a favor dessa mesma humanidade, combatendo a desigualdade, a violência contra a mulher, a criança, o idoso, o pobre, o mais frágil. Não podemos nos furtar a sermos solidários com a dor de quem nos pede ajuda e sofre injustiça. Embora tenhamos um quadro político-eleitoral um tanto desfavorável no legislativo, tivemos algumas vitórias em que foram eleitos representantes dos excluídos e assim devemos prosseguir até a eleição de Lula para que o extremismo de direita seja debelado do país e o ar se torne mais puro, os injustiçados sejam reparados e a desigualdade diminua. Para termos mais conquistas devemos mesmo seguir o pensamento gramsciano de sermos pessimistas na razão e otimista no sentimento de querer mudar as coisas. Isso é revolucionário.

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