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Opinião
De ecocidas e genocidas se faz o Brasil afundado no bolsonarismo
A ordem internacional, por mais injusta que ainda seja, não parou – como eles – no século XVIII, no período pré-revolução francesa
Por
Milton Rondó
09.09.2019 15h35
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A ecocidas convém serem também genocidas?
O miliciano da Bic anunciou que pretenderia indultar os responsáveis pelos massacres do Carandiru (111 pessoas) e de Eldorado dos Carajás (19 camponeses sem Terra).
Uma das características culturais dos latifundiários e capangas é assimilar seus domínios (geralmente, terra invadida) ao país, como se a nação fosse um fazendão ampliado.
Iludem-se, perigosamente: são coisas bem diversas.
A ordem internacional, por mais injusta que ainda seja, não parou – como eles – no século XVIII, no período pré-revolução francesa.
Crimes de ecocídio e genocídio – estes principalmente – podem e devem ser julgados pelo Tribunal Penal Internacional (TPI).
As penas são duras, duríssimas, proporcionais à gravidade dos crimes.
Infelizmente, o Tribunal ainda não comporta crimes econômicos.
O miliciano mor e o sinistro da área estariam em maus lençóis.
Ao desmontarem a base econômica nacional, em um sofisticado projeto de recolonização do país (elaborado fora e executado pela extrema-direita local), os milicianos adotam ataques cirúrgicos, transpondo para o plano econômico as táticas militares adotadas pelos EUA e Israel nas agressões imperialistas.
O alvo da vez é a Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo, empresa pública federal), que pretendem privatizar, com o aval da musa do veneno, suposta sinistra da agricultura (sim, aquela que libera um agrotóxico letal por dia). Por lá, passam aproximadamente 50% dos alimentos que consumimos.
Vale notar que o principal fator inflacionário no Brasil e em aproximadamente 80% dos países são os preços dos alimentos no varejo.
Convém associar que no Brasil, como nessa grande maioria de países, a distribuição – o varejo – de alimentos é extremamente concentrado.
No nosso caso, aproximadamente 50% dos alimentos que adquirimos são comprados em supermercados. Nesse segmento, três grandes redes internacionais (Walmart, Carrefour e Pão de Açúcar/Casino) detêm aproximadamente 70%.
Com a venda da Ceagesp, essa concentração deverá aumentar ainda mais, passando da situação de oligopólio para monopólio.
Os reflexos sobre a inflação deverão ser brutais e praticamente imediatos.
Pior, como o próprio nome da Ceagesp indica, a empresa também se ocupa do armazenamento público, essencial para os pequenos e médios produtores, que, em geral, não contam com estruturas próprias de armazenagem ou têm dificuldade em arcar com os altos custos de armazenagem.
Sem poder dispor dessas estruturas, são obrigados a venderem a produção toda ou parcialmente no imediato após-colheita ou em prazo curto, justamente quando a oferta é maior e os preços – por esse motivo – depreciados.
Dessa maneira, lucrarão ainda mais os atravessadores, principalmente as grandes empresas transnacionais (não são mais do que cinco que detém a maior parcela desse mercado).
Os lucros serão enviados para fora e aqui os produtores e os consumidores ficarão ainda mais pobres, entregues ao arbítrio do monopólio. Tristíssimo cenário.
Nesse quadro, evidentemente não se discute a democratização da distribuição.
A bem da verdade, nem a direita, nem a esquerda, incluíram nos programas de governo a preocupação com o acesso físico aos alimentos, embora a esquerda preveja formas variadas de renda mínima que o facilitam.
De fato, a distribuição é tema complexo, que requer análise cuidadosa, inclusive no que tange às chamadas “cidades obesogênicas”, espaços urbanos em que o acesso a alimentos saudáveis é difícil ou virtualmente impossível.
Um exemplo eloquente? Brasília. Não as cidades satélites, periféricas. O centro do poder: a Esplanada dos Ministérios. Lá, pode-se comprar todo tipo de “alimento” industrializado, mas não tente comprar uma banana. Só de ambulantes. Um verdadeiro deserto nutricional, a emular simbolicamente aquele das ideias.
O que dizer então do fechamento dos restaurantes populares, sobretudo nas capitais, Porto Alegre incluída?
Para quem vem da periferia das grandes cidades e trabalha no centro, sem poder voltar para casa na hora do almoço, como ter uma alimentação adequada? Como fugir da coxinha e do refri (que não é muito mais do que sal e açúcar diluídos) com os parcos recursos de que dispõe?
Pois vale notar que se o centro da inflação são os preços dos alimentos no varejo, ainda mais inflacionados são os preços da alimentação em bares e restaurantes, que se beneficiam da segregação espacial que confina os trabalhadores e trabalhadoras a periferias cada dia mais distantes e inacessíveis em curtos espaços de tempo.
Como ando parco de sonhos, como sói acontecer em meio aos pesadelos, recorro ao maior estadista da atualidade, o Papa Francisco, que, no diálogo com os movimentos sociais, afirmou: “Que pode fazer aquele estudante, aquele jovem, aquele militante, aquele missionário que atravessa as favelas e os pardieiros com o coração cheio de sonhos, mas quase sem nenhuma solução para os seus problemas? Muito! Podem fazer muito. Vós, os mais humildes, os explorados, os pobres e os excluídos podeis fazer muito. Atrevo-me a dizer que o futuro da humanidade está, em grande medida, nas vossas mãos, na vossa capacidade de vos organizar e promover alternativas criativas na busca diária dos”3 Ts” (terra, teto e trabalho) e também na vossa participação como protagonistas nos grandes processos de mudanças nacionais, regionais e mundiais. Não se acanhem!”. (*)
*(Extrato do livro “Papa Francisco com os movimentos sociais”; Org: Robson Savio Reis Souza; Editora Paulinas)
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