Marcas da maldade

Bolsonaro incitou a quebra de tabus indispensáveis para o convívio social. A pacificação do País levará tempo

O ex-presidente Jair Bolsonaro. Foto: Silvio Avila/AFP

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Já escrevi em uma de minhas colunas em CartaCapital que a banalidade do mal, tal como a compreendeu a filósofa Hannah Arendt, não tem nada a ver com a banalização da maldade. O primeiro indica o descompromisso de alguém – um torturador, por exemplo – em relação aos crimes que pratica. Ao ser julgado no pós-Segunda Guerra Mundial, o carrasco nazista Adolf Eichmann alegou que “apenas cumpria ordens” de seus superiores, atitude classificada por Arendt como a banalidade do mal.

Posta essa diferença, quero abordar neste texto alguns acontecimentos tenebrosos, no Brasil pós-Bolsonaro, que tomo a liberdade de chamar de “banalização da maldade”. Todos eles têm a ver com a quebra – apregoada e exaltada pelo ex-presidente – de um tabu essencial para o nosso convívio em sociedade: o da dignidade do outro, tanto física quanto moral.

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2 comentários

PAULO SERGIO CORDEIRO SANTOS 13 de novembro de 2023 01h02
O homem cordial, em Raízes do Brasil de Sérgio Buarque de Holanda precisa expandir o seu ser na vida social, precisa estender-se na coletividade – não suporta a individualidade, precisa ‘viver nos outros’. Ocorre que no Brasil de tempos idos e contemporâneos o brasileiro não é nada cultivador da cordialidade. É bem, ao contrário, defensor da violência e do Estado violento. Por isso temos tantos representantes não do homem cordial mas do homem violento em nossa sociedade. E Bolsonaro fez com que essa violência latente aflorasse com maior vigor e o desrespeito às mulheres, negros, indígenas, ás minorias fosse cada vez mais uma realidade no cotidiano e nas páginas policiais brasileiras. Daí se explica, que mesmo tendo cometido tantos crimes, Bolsonaro quase tenha vencido as últimas eleições presidenciais. Precisamos mudar a nossa mentalidade formando pessoas sãs e conscientes de seus direitos e obrigações. Essa é uma tarefa do Estado brasileiro, mas que não venham dizer que governantes de esquerda são autoritários. A violência parte de uma classe privilegiada que quer manter o seu status quo através da violência e, por isso, muitos deles compram a mídia, os jornais, as igrejas se travestindo de democratas, mas o que querem mesmo é um Estado autoritário que mantenha os seus privilégios e seja porta voz dessa violência que vivemos. Belo e oportuno artigo, prezada Maria Rita Kehl.
Paulo Cesar de Abreu Cobucci 15 de novembro de 2023 13h19
PCAC

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