O baixo clero no poder

O “PL do Estupro” e a PEC que criminaliza os usuários de drogas são reveladores da degradação moral e política do Congresso

A dupla Pacheco e Lira revela não ter nenhum sentimento de grandeza ou de compromisso com a democracia – Imagem: Jefferson Rudy/Ag. Senado

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Dois episódios maiores, um na Câmara dos ­Deputados e outro no Senado, e vários menores são reveladores da degradação moral e política do Congresso Nacional como um todo. São reveladores também do oportunismo e da mediocridade política dos presidentes das duas Casas Legislativas. Explicitam claramente a perda de significado e de sentido da representação política, que deveria guiar-se por critérios de prioridade dos interesses da sociedade e do País, diante de tantas urgências e necessidades que a maioria dos brasileiros padece.

No caso da Câmara dos Deputados, o episódio degradador refere-se ao Projeto de Lei 1904/24, o chamado “PL do Estupro”, que equipara o aborto ao homicídio quando realizado após a 22ª semana de gestação, mesmo nos casos de interrupção da gravidez permitidos pela atual legislação, quando a mulher é vítima de violência sexual, a gestação traz risco à vida da mãe ou o feto é anencéfalo. A aprovação da urgência do projeto, o que significa que ele não vai ser debatido por comissões da Câmara, passará direto para a votação do plenário, é fruto de algumas conjugações.

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3 comentários

PAULO SERGIO CORDEIRO SANTOS 23 de junho de 2024 04h09
De fato, caro articulista, Pacheco e Lira são o retrato do Congresso Nacional medíocre, hipócrita e reacionário que temos. O presidente Lula precisa fazer uma ginástica colossal para engolir esses dois e poder governar. É fato que a primeira-dama Janja da Silva, teve um papel político proativo nas manifestações contra o PL do aborto ao passo que Lula ficou observando, mas depois em pronunciamento fez duras críticas e disse que o aborto é uma questão de saúde pública, mesmo sendo contra o aborto, mas fez uma defesa do aborto legal. Lula é um estrategista. Ele sabe que tanto o presidente da Câmara dos deputados como o presidente do Senado querem agradar os seus currais eleitorais bolsonaristas. Eles, de fato, não pensam na sociedade, não pensam no país, não pensam nos mais pobres, nas vítimas do estupro, nos usuários de drogas que esse congresso deseja equiparar a traficante de drogas. Será que esses senhores não pensam no porvir, em suas biografias. Se possuem atitudes irresponsáveis, desumanas e indignas, pensam a curto prazo é porque são homens medíocres e a democracia para eles é um sistema de fachada, em que vale a lei do mais forte e do mais esperto. Eles pensam que são espertos, mas a história irá lhes cobrar caro pela pequenez e descaso em relação aos que mais precisam do Estado e da justiça.
CESAR AUGUSTO HULSENDEGER 23 de junho de 2024 15h19
O nosso Congresso é a representação do eleitorado. Nenhum parlamentar nasceu dentro das dependências do Congresso, foram colocados lá pelos eleitores. Que se deixam levar por discursos moralistas de fancaria, pela cantilena anticorrupção, pela falácia de que política é atividade quase criminosa… E isso graças à desinformação veiculada nas ditas redes sociais, as quais a esquerda tem subestimado clamorosamente. A cidadania só se exerce plenamente se o cidadão tiver acesso a informações confiáveis, que lhe permitam fazer juízo de valor fundamentado. Mas numa época em que a maioria só busca informação nos grupos do “zap”, o que se pode esperar?
Gilson Duarte F dos Santos 25 de junho de 2024 16h26
Concordo que o Congresso atual é mediocre, etc, etc mas a questão não para por aí e na acusação endereçada aos Presidentes da Câmara e Senado. Por mim a responsabilidade maior deve ser atribuída aos dirigentes partidários. Afinal os representantes do povo são eleitos pelo voto proporcional, portanto representantes de uma agremiação política que, em última análise, define e posiciona-se sobre a pauta e se posiciona sobre ela. Acho meio despolitizante atribuir toda a culpa a Lira e Pacheco, embora os dois pertençam a partidos conservadores ou de direita.

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