Em um movimento político que parece desafiar a lógica em Brasília, surge uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com o ambicioso objetivo de acabar com a reeleição para presidentes, governadores e prefeitos, ao mesmo tempo em que propõe estender os respectivos mandatos de quatro para cinco anos.
A PEC é considerada prioridade pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), que a vê como o “primeiro passo da reformulação no sistema eleitoral”. Na linha de frente desse embate está o senador Marcelo Castro (PL), que abraçou a tarefa de relatar a proposta.
A reeleição foi incluída na Constituição Federal em 1997, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, que acabou se reelegendo graças a essa mudança. Os dois presidentes seguintes, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, foram reeleitos. Apenas Jair Bolsonaro não conseguiu ser reconduzido ao cargo.
Até o momento, o calculo é de que pelo menos 35 senadores votem a favor da PEC, que precisa de ao menos 49 votos para ser aprovada.
A promessa dos defensores da proposta é que, com o fim da reeleição, a política brasileira se torne menos centrada em campanhas eleitorais contínuas e mais focada em governança de longo prazo. Seus apoiadores argumentam ainda que isso poderia diminuir o uso indevido de recursos públicos em campanhas e aumentar a representatividade política.
Nas últimas décadas, diversas PECs pelo fim da reeleição tramitaram no Senado, mas nenhuma prosperou. Entre desejos de reforma, preocupações com a governabilidade e cálculos estratégicos, o futuro dessa proposta será decisivo para moldar a polítca brasileira nos próximos anos.
Entenda, a seguir, o que está em jogo:
Principais argumentos pró-reeleição
Os defensores da manutenção da reeleição argumentam que ela permite a continuidade de políticas públicas bem-sucedidas e oferece aos eleitores a oportunidade de recompensar governantes eficientes com um segundo mandato.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), por exemplo já expressou reservas quanto à proposta, destacando que um único mandato de cinco anos pode ser insuficiente para implementar e concluir projetos significativos. Em um encontro com senadores, Lula chegou a sugerir a possibilidade de estender o mandato para seis anos, ideia que gerou interesse, mas não foi profundamente discutida.
A ideia também já foi criticada pela presidente do PT, a deputada Gleisi Hoffmann, que classificou a iniciativa como “oportunista” e “retrocesso”.
Mesmo que seja para valer só a partir de 2030, a proposta para acabar com a reeleição de presidentes é oportunista e representa um retrocesso na representação democrática da maioria da população. Qdo os tucanos criaram a regra da reeleição, em benefício próprio, as tais elites…
— Gleisi Hoffmann (@gleisi) December 17, 2023
Se aprovada, a proposta não afetaria a elegibilidade de Lula para uma próxima reeleição, mas poderia abrir caminho para a volta de figuras como o ex-presidente Jair Bolsonaro ao cenário eleitoral, dada a alteração nos prazos de inelegibilidade.
O ex-capitão foi condenado a 8 anos de inelegibilidade pelo Tribunal Superior Eleitoral. Sendo assim, ficaria impedido de concorrer as eleições de 2030. Com o aumento de um ano no período dos mandatos dos cargos executivos, entretanto, o ex-presidente poderá estar apto a concorrer já em 2031.
Principais argumentos contra a reeleição
Em linhas gerais, a possibilidade de reeleição também é criticada por incentivar a concentração de poder e a perpetuação de práticas clientelistas e populistas, à medida que os governantes de turno podem utilizar recursos do Estado para fortalecer suas campanhas.
O freio a um segundo mandato, argumentam os defensores da medida, pode coibir a governança pública motivada por intenções eleitorais.
Além disso, a reeleição pode limitar a renovação política e a alternância de poder, elementos considerados vitais para a saúde da democracia, uma vez que pode criar desequilíbrios na competição eleitoral em favor dos incumbentes.
Sou amplamente favorável ao final da reeleição e a um mandato único de 5 anos e, eventualmente, até de 6 anos. Acho essa uma tese necessária e oportuna já que, definitivamente, o instituto da reeleição não trouxe coisas positivas para a política brasileira e são vários os…
— Jaques Wagner (@jaqueswagner) March 5, 2024
Compartilham desta visão figuras como o senador Jaques Wagner (PT). Em publicação na rede X (ex-Twitter), o senador disse que o instituto da reeleição ‘não trouxe coisas positivas para a política brasileira’.
“Eu, pessoalmente, acho muito ruim o sistema que temos hoje de uma eleição a cada dois anos. Você não sai dessa roda eleitoral contínua e não cria um ambiente de tranquilidade para governar”, escreveu.
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