Minirreforma eleitoral avança no Congresso; entenda os possíveis avanços e retrocessos da proposta

O texto altera regras de transparência, redefine cotas e reduz o período de inelegibilidade; parlamentares querem votação na Câmara até quarta

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

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O Grupo de Trabalho da Minirreforma Eleitoral na Câmara recebeu, nesta segunda-feira 11, o parecer sobre as leis que mudam regras das eleições já a partir do ano que vem.

Para que as novas normas entrem em vigor já em 2024, é preciso que haja votação no Congresso, sanção presidencial e publicação no Diário Oficial da União até o dia 5 de outubro.

A expectativa do relator na Câmara, o deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), é de que a Câmara aprove o pedido de urgência nesta terça-feira 12 e vote o seu relatório em plenário na quarta-feira 12. Em seguida, o tema deve ser apreciado no Senado.

Para especialistas ouvidos por CartaCapital, alguns pontos do texto são criticáveis.

Arthur Mello, coordenador de articulação política da organização Pacto pela Democracia, vê um debate “atropelado”, com poucas audiências públicas e reuniões “a portas fechadas”, sem incluir devidamente as entidades que estudam o tema.

O articulador afirma que a proposta pode prejudicar a participação política feminina. Atualmente, a Lei 9.504/1997 prevê que cada um dos partidos preencha ao menos 30% de suas candidaturas com mulheres. Com o novo texto, o artigo passaria a exigir o percentual mínimo na lista das federações, e não em cada partido integrante.


Mello também afirma que a proposta não assegura que o dinheiro do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e do Fundo Partidário chegue às mulheres de forma igualitária.

O texto estipula, no Artigo 16 da mesma lei, que o partido distribua os recursos de acordo com o percentual “em âmbito nacional”. Para o advogado, com o dispositivo, um partido que não dedicar recursos a mulheres num determinado município pode se livrar de punições caso alcance o percentual nacionalmente.

Além disso, o representante do Pacto pela Democracia vê itens prejudiciais à transparência eleitoral.

A minirreforma exclui o ponto II do § 4º, que obriga os partidos políticos a apresentarem um relatório no dia 15 de setembro, durante a campanha eleitoral, com a discriminação das transferências do Fundo Partidário, os recursos em dinheiro, os estimáveis em dinheiro recebidos e os gastos realizados. A mudança permite que a prestação de contas ocorra somente após a eleição.

“A gente tem avaliado a minirreforma com muita preocupação”, afirma Mello. “Não se pode fazer uma reforma eleitoral que mude as regras do jogo sem debater com a sociedade civil como um todo.”

Já o advogado Alexandre Rollo, conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo, crê que a maioria das propostas da minirreforma é positiva, mas considera como ponto negativo, por exemplo, o texto dar “carta branca” para os partidos políticos não pagarem por serviços contratados.

A permissão ocorre por meio da previsão de “impenhorabilidade” do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, em dispositivo inserido no Artigo 44 da Lei 9.906/1995. Para Rollo, a alteração possibilita que o partido não dê uma garantia de pagamento ao prestador do serviço contratado.

O advogado também diz que os parlamentares estão perdendo a oportunidade de tratar da “desincompatibilização” no caso da reeleição.

Atualmente, a Lei Complementar 64/1990 prevê prazos para que categorias se afastem de seus cargos no caso de uma disputa para prefeitos. O novo texto unifica os prazos em seis meses, mas, para Rollo, ainda permite que candidatos à reeleição em Prefeituras permaneçam no cargo “sentados na cadeira”.

O advogado destaca, no entanto, a alteração sobre o prazo dos pedidos de registro de candidaturas como uma melhoria. Enquanto o Artigo 11 da Lei 9.504 prevê o dia 15 de agosto como data limite para o registro, o novo texto impõe o limite em 26 de julho.

Segundo o especialista, o trecho ameniza o problema da falta de tempo para a Justiça analisar possíveis irregularidades nas candidaturas, para reduzir casos de eleições que, posteriormente, resultam em cassações de registro, como ocorreu com o ex-deputado Deltan Dallagnol.

“Minha visão em geral é mais positiva do que negativa”, avalia Rollo.


O deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), relator da minirreforma. Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

A minirreforma também traz as seguintes mudanças:

  • Reduz o período de inelegibilidade: o prazo de oito anos passa a ser computado a partir da data da decisão judicial. Atualmente, esse prazo é contado a partir do cumprimento da pena, por exemplo: segundo o Tribunal Superior Eleitoral, um parlamentar condenado por tráfico de drogas, primeiramente, cumpre a pena pelo crime e, após o prazo da punição, passa a cumprir os oito anos de inelegibilidade. Com a mudança, esse parlamentar já teria cumprido parte da inelegibilidade desde o dia em que a decisão judicial foi emitida;

 

  • Antecipa as convenções partidárias em 15 dias: atualmente, os partidos decidem quem serão os seus candidatos entre os dias 20 de julho e 5 de agosto, enquanto o texto antecipa esse período para o dia 5 de julho até 20 de julho;

 

  • Autoriza as doações via Pix: hoje em dia, a Lei 9.504 não previa, em seu Artigo 23, a possibilidade de transferência via Pix. Com a permissão, as doações “deverão ser divulgadas automaticamente” no site da Justiça Eleitoral, sem a necessidade de constarem em relatório financeiro durante a campanha;

 

  • Permite o uso do Fundo de Campanha em despesas pessoais: o texto prevê a possibilidade de contratação e de pagamento de serviços de segurança pessoal, em caso de comprovada ameaça, e de cuidados a dependentes legais, desde que os gastos sejam incluídos na prestação de contas;

 

  • Amplia o rol de vítimas do crime de violência contra a mulher: a minirreforma mexe na Lei nº 14.192, de 2021 e insere um trecho que prevê que os assédios, constrangimentos, humilhações, perseguições ou ameaças a “qualquer mulher em razão de atividade política, partidária ou eleitoral” sejam atos passíveis de reclusão, de um a quatro anos, e multa.

 

  • Altera regras de propaganda: o novo texto autoriza a propaganda pela internet no dia de votação, com vedação ao impulsionamento, e revoga restrições ao tamanho de faixas e adesivos em propriedades particulares;

 

  • Abre caminho para que a compra de votos não resulte em cassação: o texto institui um pequena alteração no Artigo 41-A da Lei 9.504. Antes, o dispositivo previa que a compra de votos é passível de “pena de multa de 1 mil a 50 mil reais, e cassação do registro ou do diploma”, e agora a minirreforma diz que a prática está “sob pena de multa de 10 mil a 150 mil, ou cassação do registro ou do diploma”.

Em coletiva de imprensa, o relator da matéria defendeu as mudanças propostas. Os parlamentares do grupo de trabalhos ainda discutem a redação e podem anunciar mudanças nesta terça-feira 12.

“Não precisamos de grandes mudanças, precisamos de muitos pequenos ajustes”, declarou o petista.

De acordo com Pereira Júnior, alguns temas foram deixados de lado, como o combate às fake news e as regras que tratam do financiamento empresarial das campanhas. Segundo ele, não houve consenso sobre esses assuntos no grupo de trabalhos, presidido pela deputada Dani Cunha (União-RJ).

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