Política

O Congresso no banco dos réus e condenado

Tribunal simbólico julgou a Câmara e o Senado como moralmente culpados pela situação em que o País se encontra

"O Congresso tem suas mesas, pautas e gravatas manchadas de sangue", afirmou o jornalista Alceu Castilho no evento
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A Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) sediou na segunda-feira 25 o IV Tribunal Tiradentes, um julgamento simbólico que teve como réu o Congresso Nacional. Como presidente do Tribunal, o desembargador e pró-reitor da universidade, Antônio Carlos Malheiros, declarou os parlamentares moralmente culpados “perante a nação brasileira”.

Segundo uma pesquisa da Datafolha de dezembro de 2016, quase 60% da população brasileira avalia como ruim ou péssimo o trabalho dos parlamentares. Esse resultado é o pior desde 1993, quando a taxa chegou a 56%. Apenas 7% da população analisa como bom ou ótimo o desempenho do Congresso Nacional.

“Grande parte da perda de direitos e conquistas históricas ocorre hoje por causa deste Congresso. O Executivo não conseguiria fazer o que tem feito sem o apoio que tem da maioria dos congressistas”, afirmou a deputada Luiza Erundina (PSOL-SP), que estava presente no evento.

Reforma trabalhista

“A recente reforma da legislação trabalhista, além de constituir grave retrocesso de direitos, estaria eivada do vício da inconstitucionalidade, de acordo com o relatório elaborado pelo Ministério Público do Trabalho”, afirmou Malheiros.

A nota publicada pelo MPT, em abril de 2017, reforça o déficit democrático da medida ao não permitir a compreensão e participação popular. O projeto, transformado em lei em julho, compromete a “legitimidade da nova legislação, em muitos pontos claramente prejudicial aos trabalhadores”, disse o MPT.

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No Brasil, “as transformações no mundo do trabalho serão mais profundas daquelas que conhecemos”, entende o economista Marcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT. Pochmann participou como um dos jurados e se levantou contra a reforma trabalhista e o projeto de terceirização.

Pochmann explicou que antes da reforma empresários brasileiros criticavam as formas de contratação trabalhista na China, travando uma difícil competição produtiva. Se antes o custo trabalho horário era cinco vezes maior no Brasil do que na China, hoje esse quadro se inverte. Na China é 16 vezes maior. “Hoje temos um novo marco do trabalho que trata da legalização da ilegalidade”, afirmou o economista.

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Bancada Ruralista

Alceu Castilho, jornalista e autor do livro Partido da terra: como os políticos conquistam o território brasileiro, também participou como jurado e reforçou em seu discurso a atuação da bancada ruralista. O jornalista lembrou a participação de agentes do Estado na chacina de Pau D’arco, no sudeste do Pará, em que dez trabalhadores rurais foram executados. A perícia da Polícia Federal confirmou o crime.

Segundo Castilho, os projetos de lei apresentados contribuem para esse quadro, como o projeto de lei que prevê a venda de terras a investidores estrangeiros. “Temos sangue no Brasil e ele passa por Brasília”, afirmou.

Castilho destaca o poder da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), cujo presidente, Nilson Leitão (PSDB-MT), é um dos deputados com com maior número de processos no Supremo Tribunal Federal.

Metade dos votos a favor do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff partiram da FPA. Ao mesmo tempo, 51% dos votos que negaram as investigações de Michel Temer por corrupção passiva também são da FPA. A frente tem 216 deputados e 17 senadores. “A bancada ruralista tem o poder de derrubar e manter presidentes”, afirma Castilho. Francisco Whitaker, o defensor de um outro Congresso Nacional, e Luiz Erundina, que também esteve presente (Foto: Caroline Oliveira) Mas o que é o Legislativo?

Francisco Whitaker, político e membro da Comissão Justiça e Paz, atuou no Tribunal como defensor do Congresso Nacional. Ele lembrou lembrou qual deveria ser a função do Poder Legislativo.

“O Legislativo é o povo decidindo através de seus representantes, por isso tem um poder muito grande. Só o Legislativo pode fiscalizar o governo e destituir o Poder Executivo. Mais do que autorizar, deveria estar exigindo essas investigações”, afirmou Whitaker em relação à rejeição da Câmara dos Deputados à denúncia de Rodrigo Janot.

“O Congresso virou um cartório homologador das vontades do Executivo, respondendo ao comando da oligarquia que faz parte do País”, afirma.

“Como eles representam? Quando eles representam? Quem eles representam? Onde representam?”, questionou Cileda Perrella, professora da Faculdade Zumbi dos Palmares e mãe de um dos 18 jovens detidos recentemente no Centro Cultural São Paulo antes de protesto contra Temer. Ela participou do júri do Tribunal.

Tribunal Tiradentes

O Tribunal Tiradentes foi inspirado no Tribunal Russell, constituído nos Estados Unidos em 1966 para julgar, também simbolicamente, os crimes ocorridos durante a Guerra do Vietnã. O evento também foi realizado posteriormente para condenar e denunciar situações de violência nas ditaduras da América Latina.

A primeira sessão do Tribunal Tiradentes aconteceu em 1983 e julgou a Lei de Segurança Nacional. As edições posteriores condenaram o Colégio Eleitoral da ditadura militar brasileira e a Lei de Anistia.

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