Política

O “maquiavelismo” econômico de Michel Temer

Temer usa como argumento a suposta melhora da economia, mas o crescimento depende de instituições, e sua permanência no cargo as afeta negativamente

Michel Temer: sua presença compromete as instituições
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No desespero, é comum o apelo a qualquer coisa que possa trazer esperança. Diante das delações da JBS, o presidente Michel Temer construiu dois argumentos para dar sobrevida ao seu governo. Por um lado, há um recurso jurídico, que se desdobra em dois, (i) o rito processual das delações e (ii) a veracidade do conteúdo gravado, que Temer coloca sob suspeita de ter sido editado pelo delator. Por outro lado, Temer também lançou, com coro de seus principais aliados no Planalto, um argumento de natureza econômica, sintetizado na expressão “o Brasil não pode parar”. É nesse ponto que irei me ater. 

Em ambos os pronunciamentos que fez à nação e antes de entrar no mérito das acusações que pesam sobre ele, Temer fez referências a dados econômicos que mostrariam uma melhora da situação econômica do País.

Em suas palavras, estes dados colocaram seu governo no seu “melhor momento” – o que sugere a todos que o Brasil também estaria em um momento melhor, em meio à crise que o assola há alguns anos. Inflação em queda, desemprego estabilizado, índices de confiança se elevando, reformas da Previdência e trabalhista andando no Congresso, tudo isso conformaria o “melhor momento” de Temer. 

Assim sendo, Temer traçou a estratégia de usar os dados econômicos como um atenuante aos seus diversos atos suspeitos gravados na delação da JBS. Sua aposta é a de que, desta forma, ele consiga pelo menos uma espécie de indulto econômico para permanecer no cargo. Em claro estilo maquiavélico, os fins – a melhora da economia – justificam os meios – a sua permanência no cargo. Eis o “maquiavelismo” econômico de Temer. 

Contudo, o que Temer e seus aliados não dizem, mas os economistas sim, é que o crescimento econômico de qualquer país no longo prazo depende crucialmente das suas instituições, isto é, do conjunto de instâncias formais e informais que regula o comportamento individual e coletivo das pessoas.

Cultura é um fundamento das instituições e o precedente que Temer abre com seu argumento econômico é o de que no Brasil qualquer coisa vale para se resolverem problemas econômicos de curto prazo. “O melhor momento” de seu governo se sobreporia “ao pior momento de seu governo”.

No longo prazo restará, entretanto, a instituição de que, para atingir um fim econômico, um presidente pode passar por meio de qualquer coisa, inclusive do comportamento ético requerido para ocupar o cargo. No fundo, o que a Operação Lava Jato vem mostrando é que a política não pode tudo, e a operação é tocada por servidores do Estado brasileiro que, independente de partidos e governos, fazem cumprir as instituições formais do Brasil: suas leis. 

Enfim, Temer deveria renunciar. Sua permanência é um problema para a economia e o desenvolvimento brasileiros no longo prazo, pois sugere à população do País que tudo pode em nome de melhores indicadores econômicos de curto-prazo – que sem dúvida importam, mas menos do que o exemplo ético de se ocupar o cargo de presidente do Brasil.

Se Temer pode tudo pelas questões econômicas e o “Brasil não pode parar”, por que um empresário não poderia ter um comportamento similar? Por que não eu e você podemos tudo? Ser presidente não garante a Temer ser diferente, pelo contrário, é o que mais deve o fazer igual a todos os brasileiros. 

*Fábio Terra é professor da Universidade Federal do ABC. É pós-doutor em Economia pela Universidade de Cambridge, Reino Unido.

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