O que é a Codevasf e por que a empresa é tão cobiçada pelo Centrão

A estatal viu seu rol de atividades disparar no governo Bolsonaro (PL); o modelo facilita nomeações de apadrinhados políticos

Policiais federais realizando operação em superintendência da Codevasf. Foto: Divulgação/Polícia Federal

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Uma suposta organização criminosa que agia para fraudar licitações, desviar recursos públicos e praticar lavagem de dinheiro com valores destinados à Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba, a Codevasf: esse núcleo, identificado pela Polícia Federal, foi alvo da Operação Benesse, deflagrada nesta sexta-feira 1º.

Os nomes envolvidos negam as acusações. A Codevasf informou que “mantém compromisso com a elucidação dos fatos e com a integridade de suas ações”. 

O funcionário citado pela empresa é Julimar Alves da Silva Filho, ex-gerente da 8ª Superintendência, em São Luís (MA), acusado de ter recebido 250 mil reais da construtora Construservice. Em agosto, a defesa do ex-funcionário negou que ele tivesse participação no suposto esquema.

Não é a primeira vez que a Codevasf, conhecida em Brasília como “balcão de negócios do Centrão“, vê o seu nome envolvido em operações que investigam práticas irregulares. A companhia tem no seu histórico nomeações de pessoas ligadas a figuras políticas do Centrão.

O que é a Codevasf

A Codevasf foi criada durante a ditadura militar, por meio de uma lei assinada pelo general Ernesto Geisel. Inicialmente, o seu foco era promover o desenvolvimento da região da bacia do Rio São Francisco. 


Entretanto, ao longo dos anos, o rol de atuação da companhia se expandiu: em 2000, o então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) fez com que a Codevasf passasse a ser responsável pela área da Bacia do Rio Parnaíba (no Piauí e no Maranhão). Crescimento semelhante (no caso, para Alagoas) aconteceu durante a gestão de Michel Temer (MDB).

Nada, porém, que se compare à ampliação conferida por Jair Bolsonaro (PL) à Codevasf. Em 2020, o ex-capitão fez com que a área de atuação da companhia chegasse a 15 estados, correspondentes a 36% do território nacional. A expansão exigiu recursos: entre 2020 e 2021, as licitações na Codevasf em matéria de pavimentação cresceram 240%.

A mina do Centrão

As sucessivas ampliações dos braços da Codevasf fuzeran crescer, também, as nomeações para cargos de gerência e o volume de recursos a serem administrados. 

O dinheiro público que se destina à empresa é composto também por emendas parlamentares, recursos indicados pelos parlamentares quee beneficiam, geralmente, seus redutos eleitorais. Em 2021, a Codevasf recebeu cerca de 1,3 bilhão de reais via emendas. 

Além disso, a empresa é responsável pela execução de obras. Do ponto de vista político e eleitoral, é positivo para um político sinalizar aos seus apoiadores que teve responsabilidade por obras.

A Codevasf se baseia em gestores regionais. O modelo, que facilita as indicações políticas nas superintendências, já beneficiou, por exemplo, o entorno do atual presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).

Em março, a Controladoria-Geral da União divulgou um relatório a apontar indícios de superfaturamento em licitações e maquiagem na prestação de contas durante o governo Bolsonaro. Contratos identificados como irregulares pela CGU foram firmados na Bahia, em Sergipe e no Amapá, somando 100 milhões de reais. 

Vários outros casos de irregularidades (sob suspeita ou comprovadas) já vieram à tona. Um deles aconteceu em maio, quando uma auditoria da CGU apontou o uso de recursos da União para asfaltar uma propriedade privada ligada à Igreja Universal do Reino de Deus em Irecê, na Bahia. A obra foi estimada em 2,3 milhões de reais. 

Com a volta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Palácio do Planalto, críticos da ampliação da influência do Centrão esperavam que o petista desfizesse o “balcão de negócios” da Codevasf.

A presidência da empresa, porém, continua sob a batuta do engenheiro Marcelo Andrade Moreira Pinto, apadrinhado de Elmar Nascimento (BA), líder do União Brasil na Câmara. Em abril, o governo federal nomeou para o comando da Codevasf no Piauí o engenheiro Marcelo Vaz da Costa e Castro, filho do senador Marcelo Castro (MDB-PI), um dos responsáveis por destinar verbas à Codevasf.

No primeiro trimestre deste ano, as doações feitas pela Codevasf somaram 106 milhões de reais. O valor não é distante dos 117,6 milhões de reais que esses mesmos recursos somaram no primeiro trimestre do ano passado. A maior parte dos recursos é destinada a prefeituras: em 2022, 74% da verba teve esse destino.


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