Política

PMDB: diagnóstico de uma patologia política

O partido é refém do acordo tácito entre o governo Temer e as duas faces da Lava Jato, a midiática e a jurídica, em prol das reformas antipopulares

Governo Temer, PMDB com DNA tucano
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Continuo aqui a reflexão iniciada no artigo anterior, intitulado “Adeus PMDB”. Aquele texto faz uma constatação: o comportamento disfuncional e potencialmente autodestrutivo do PMDB, que depois de ter se unido sob a liderança de Michel Temer, Romero Jucá, Renan Calheiros e tantos outros líderes menores para derrubar o governo de cuja coalisão de sustentação parlamentar eram parte fundamental, formou um novo governo, sob a batuta de Temer, o qual paradoxalmente implanta um programa de reformas que é em tudo a cara do PSDB.

Sim, pois partido fisiológico que é, pulverizado em câmaras de vereadores e prefeituras do interior, em assembleias legislativas e governos estaduais Brasil afora, e em grupos de parlamentares de orientação regional, o PMDB tende a sofrer na própria pele as consequências eleitorais da redução drástica do gasto público aprovada sob o seu beneplácito.

Mas qual seria a causa por trás desse comportamento anômico do PMDB? Nesse texto começo a ensaiar uma resposta, que vai me tomar certamente alguns artigos. Permitindo-me a metáfora biológica, organismos ficam doentes por dois tipos de fatores, internos e externos.

De cara, arrisco dizer que o desarranjo comportamental do partido não se deve a um fator interno. Suas redes de influência, clientela e compadrio, seus grupos internos continuam a existir da mesma maneira como o faziam sob o outro governo. Nesse sentido, em relação a seu partido, Temer se assemelha mais a um administrador de condomínio do que a um déspota, pois não empreendeu esforços para reorganizá-lo de maneira radical. Ainda que seja um “PMDBista” meio de araque, com DNA tucano claro, o atual presidente parece não estar interessado em imprimir sua marca sobre seu próprio partido, para além do estrago que suas reformas podem fazer.

Temos de buscar as causas em fatores externos. Agindo como médico, ou melhor, veterinário, que examina um organismo doente, não podemos ignorar um potencial agente infeccioso: a Operação Lava Jato. A questão é saber como a infecção se dá, ou seja, como a Lava Jato consegue surtir tamanho efeito no partido do finado doutor Ulysses.

Para responder a essa questão precisamos, antes, responder a uma pergunta anterior: no que consiste a Operação Lava Jato, qual sua natureza? Não me parece que a maioria dos brasileiros tem clara tal resposta. A Lava Jato tem uma natureza dupla: ela corresponde a uma complexa operação do sistema de justiça, que envolve Ministério Público, Justiça Federal do Paraná, Supremo Tribunal Federal e Polícia Federal com potencial altamente lesivo para quem dela se torna réu ou mesmo suspeito, particularmente se for integrante do PT ou de sua base parlamentar.

Os líderes da operação, o juiz Sergio Moro e o grupo de procuradores federais do Paraná, adotam práticas como violar direitos dos investigados, vazar depoimentos e escutas telefônicas, alguns inclusive ilegalmente obtidos, estender o período de prisões temporárias de maneira anômala, com o intuito de arrancar delações, negociar penas por delações etc. Tudo isso com o beneplácito do TRF do Rio Grande do Sul e do STF, que nada fazem para coibir esses abusos.

Mas a Lava Jato é também um ícone, um símbolo midiático de alto poder, usada pelos meios de comunicação para corroer a legitimidade do sistema político e particularmente para atacar o PT, Lula e Dilma, quando essa era presidente – vejam os dados dessas coberturas na página do Manchetômetro.

Para a Lava Jato, o PMDB foi até agora “colateral damage”, como se diz em inglês. Mas o envolvimento de vários dos seus líderes nos esquemas investigados é tamanho que os torna reféns de uma ordem que não escolheram: o reformismo alucinadamente neoliberal do governo Temer.

Há, portanto, um acordo mais ou menos tácito entre Temer e as duas faces da Lava Jato, a jurídica e a midiática, em torno dessa agenda reformista antipopular, e o PMDB nesse acordo é refém. Essas são as causas externas de seu comportamento patológico. Enquanto os políticos do partido rezarem a cartilha, são poupados da sanha inquisidora dos paladinos da justiça caolha e dos holofotes cáusticos da mídia, com a exceção de eventuais cordeiros sacrificiais: Eduardo Cunha, Sergio Cabral… (Renan Calheiros que se cuide).

Qual o desfecho dessa trama macabra? É difícil saber com precisão, mas podemos estar certos que o Brasil estará aí sempre a perder.

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