Saúde
Ricardo Barros e a culpa “das mães” na obesidade infantil
Ignorando a figura paterna, ministro da Saúde associa sobrepeso infantil a crianças não aprenderem a descascar alimentos “com as mães”
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O ministro da Saúde, Ricardo Barros (PP-PR), associou o problema da obesidade infantil ao fato das crianças não terem oportunidade “de aprender a descascar alimentos” com suas mães.
“É preciso qualificar essas crianças para manipular os alimentos. Muitas delas não ficam em casa com as mães e não têm oportunidade de aprender a descascar os alimentos”, afirmou, sem fazer qualquer referência à figura do pai ou de outros homens no processo de ensino-aprendizagem das crianças.
A fala do ministro foi feita no contexto do anúncio de um plano de metas para reduzir a obesidade infantil no Brasil. No entanto, ela revela mais uma vez o apego do governo de Michel Temer em determinar papéis “naturais” para homens e mulheres, associando a última às atividades domésticas e aos cuidados com as crianças.
Em discurso no Dia Internacional da Mulher, Temer destacou o papel delas no trabalho doméstico e no gerenciamento das compras de supermercado. A declaração no 8 de março causou polêmica e levou a uma retratação do presidente no dia seguinte.
Na fala feita na quarta-feira 15, Ricardo Barros fez referência ao fato de que, atualmente, as mulheres “não ficam em casa”, o que impede as crianças de acompanhá-las nas tarefas do dia a dia.
“Hoje as mães não ficam em casa, e as crianças não têm oportunidade, como tinham antigamente, de acompanhar a mãe nas tarefas diárias de preparação dos alimentos. E vai ficando cada vez mais distante a capacidade de pegar um alimento natural e saber consumi-lo”, afirmou.
Não é a primeira vez que o ministro da Saúde faz declarações equivocadas com relação a questões de gênero. Ele já disse que os homens vão menos ao médico porque “trabalham mais” em agosto do ano passado. Na realidade, as brasileiras trabalham 7,5 horas a mais do que os brasileiros. O motivo principal é a dupla jornada, combinação do trabalho remunerado e do doméstico.
Mesmo quando exercem jornadas de trabalho remunerado em período integral, 40 a 44 horas semanais, as mulheres continuam dedicando entre 20 e 25 horas por semana com cuidados com os filhos e os maridos.
A desigualdade na distribuição das tarefas entre os sexos – 90% delas realizam atividades domésticas ante 46% dos homens – acaba contribuindo para a perpetuação de estereótipos e para a sobrecarga de trabalho feminino.
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