PolĂtica
âJanot meteu os pĂ©s pelas mĂŁosâ
Os erros que podem anular a delação da JBS resultam da chefia inconsequente do procurador-geral, diz o ex-ministro EugĂȘnio AragĂŁo
Ministro da Justiça no fim do governo Dilma Rousseff, respeitado procurador de carreira, EugĂȘnio AragĂŁo nĂŁo estĂĄ entre aqueles que descobriram subitamente os excessos e equĂvocos da Lava Jato. CrĂtico contumaz das medidas de exceção encampadas pelo MinistĂ©rio PĂșblico e pela Justiça, AragĂŁo vĂȘ confirmadas suas teses no episĂłdio da delação premiada dos executivos da JBS.
Para ele, Rodrigo Janot âmeteu os pĂ©s pelas mĂŁosâ e terĂĄ muitas perguntas a responder quando deixar a chefia da Procuradoria Geral da RepĂșblica. O ex-ministro espera uma âgestĂŁo mais profissionalâ de Raquel Dodge, que assume o comando da corporação em 17 de setembro. Sob Janot, diz, o MinistĂ©rio PĂșblico foi acometido por uma âdoença infantilâ que nĂŁo salvou a democracia e quebrou a economia.
CartaCapital: SerĂĄ possĂvel salvar as provas da delação da JBS ou elas estĂŁo comprometidas?
EugĂȘnio AragĂŁo: Em tese, uma reavaliação da delação nĂŁo implica a anulação das provas. Em tese. O que aconteceu neste caso parece, porĂ©m, uma fraude na coleta da delação. E as conversas entre o Joesley Batista e o Ricardo Saud comprometem as provas colhidas pela Procuradoria Geral da RepĂșblica. As conversas dĂŁo conta de um acerto entre o entĂŁo procurador Marcelo Miller e os investigados antes da ida de Joesley Batista ao PalĂĄcio do Jaburu. Parece claro um mĂ©todo e um objetivo: o empresĂĄrio agiria para colocar palavras na boca de Michel Temer. Ou seja, o Joesley atuou, sem autorização judicial, como uma longa mĂŁo do MinistĂ©rio PĂșblico. Ă um comportamento completamente fora da hipĂłtese aceita pela jurisprudĂȘncia. A escuta ambiental ou Ă© autorizada judicialmente ou pode ser feita por um dos interlocutores quando a gravação serve para a prĂłpria defesa. NĂŁo foi o caso. Tratou-se de dar um presente para o MinistĂ©rio PĂșblico investir contra Temer. Se esse esquema se confirmar, as provas estarĂŁo definitivamente comprometidas.
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CC: Quais seriam as consequĂȘncias sobre outras delaçÔes, a começar por aquela do doleiro LĂșcio Funaro?
EA: Essa delação do Funaro terĂĄ de ser analisada com muito cuidado. O MinistĂ©rio PĂșblico, estamos cansados de saber, sĂł libera os acordos quando o sujeito entrega aquilo que os procuradores desejam. Se o Funaro tiver sido induzido a confirmar as provas do Joesley, teremos uma continuidade delitiva do MP. Se ocorreu uma indução, configura-se um caso tĂpico de improbidade administrativa. Uma ilegalidade clara. NĂŁo dĂĄ mais para considerar as provas apresentadas pelo Rodrigo Janot em delaçÔes premiadas pelo valor de face.
Janot: o horizonte estĂĄ turvo (Foto: Wilson Dias/ABr)
CC: Na noite da terça 5, Janot apresentou uma denĂșncia contra Lula e Dilma Rousseff baseada apenas em delaçÔes.
EA: Essa denĂșncia estava pronta hĂĄ muito tempo. Ele usou o momento para divulga-la em busca de se reaproximar daqueles que o criticavam, em especial a mĂdia. Para mim, 239 pĂĄginas configuram uma denĂșncia inepta. Quando Ă© preciso contar uma longa histĂłria para dizer qual o crime, ele nĂŁo existe. DenĂșncia bem fundamentada tem no mĂĄximo 20 pĂĄginas.
CC: O que o senhor espera da gestĂŁo de Raquel Dodge Ă frente da Procuradoria Geral da RepĂșblica?
EA: Mais profissionalismo. Ela conhece muito melhor o processo penal e tem atuação na ĂĄrea de direitos humanos. As doenças infantis que acometeram o MinistĂ©rio PĂșblico durante a gestĂŁo do Janot, acredito, nĂŁo se repetirĂŁo. Este gran finale Ă© o resultado da maneira como o procurador-geral conduziu o MP. Botou os pĂ©s pela mĂŁo. Meteu-se em uma ĂĄrea que nĂŁo conhecia. Pretendeu usar os instrumentos da Justiça para fazer polĂtica. As consequĂȘncias foram trĂĄgicas. Ao dar espaço a uma garotada, sem exercer influĂȘncia e liderança sobre eles, nĂŁo salvou a democracia e destruiu a economia do Brasil. Agora terĂĄ muitas perguntas a responder.
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