Economia
Um novo recorde na agropecuária
Insistem, mas o setor não anda para trás
Ô trem persecutório, sô! Tanta espreita nas folhas e telas cotidianas e a tal da agropecuária não anda para trás.
El Niño, queda nas cotações das commodities, chineses todos em dieta, custo abusivo dos insumos convencionais e consequente queda no uso, governo atarantado, Senado e Câmara avacalhados, juízes que nem a Fifa aceitaria, economia parada, sem demanda, mas com inflação em alta, e Selic subindo só para fazer crescer a dívida pública. Esta semana deram uma brecada, sob protestos ortodoxos.
Enquanto isso, pencas de tomates e bulbos de cebolas acariciam corações rurais e intrigam os olhares de William e Renata, prontos para chamá-los de vilões da inflação. Nem reparei, mas já começaram a entrevistar as donas de casa?
E aí, justamente, quando me preparo para entrar na onda pessimista, uns loucos do Ministério da Agricultura vêm e dizem que teremos um novo recorde no valor bruto da produção agropecuária (VBP).
Para 2016, estima-se 503,6 bilhões de reais. Não é pouco não. Em 2007, chegou-se a 325,7 bilhões de reais. Se a boa e velha HP não me falha, crescimento de 54,6% no período ou de 5% ao ano. Talvez apenas a vendagem de CDs de novos sertanejos ou estilistas de axé e funk tenham alcançado crescimento tão expressivo.
Fui. Antes que os leitores pensem que estou querendo trazer otimismo à Federação de Corporações. Longe de mim tal descalabro.
Fósforo: não risque que explode
Não, não falo daquelas caixinhas que eternizaram o batuque do grande Elton Medeiros, em sambas inesquecíveis. Falo do contido nos fosfatos aplicados em adubações cavalares e que ainda permanecem enterrados nos solos, como notas de dólares saídas dos bolsos agrícolas.
Falo do P2O5 (quem é da área sabe do que estou falando) de que nossas terras de cerrado são muito dependentes, assim como nos EUA o nitrogênio manda.
Somos fartos em jazidas de fosfatos. Na época dos governos militares foram expressivos os investimentos em exploração. Daí, atualmente, ser esse o nutriente onde é menor a dependência de importações.
Pergunte a qualquer agrônomo. Facilmente, ele confirmará o excesso de fertilizantes químicos fosfatados dormindo nos solos brasileiros, o que é prejudicial ao meio ambiente, à sanidade das plantas e, claro, ao bolso do agricultor.
O consumo de fertilizantes químicos e minerais, em 2015, deverá ser 12% menor do que no ano anterior. Analistas do óbvio remetem à relação entre os preços dos insumos e as quedas nas cotações das commodities agrícolas, ambos dolarizados.
Também, mas não só. É crescente a percepção dos produtores da necessidade de associar aos tratamentos convencionais novas tecnologias, de extrações natural e orgânica, capazes não apenas de viabilizar o custo por hectare plantado, mas também aumentarem a produtividade, a resistência a estresses hídricos, pragas e doenças, além de absorver os excessos de nutrientes lá retidos, principalmente o fósforo.
Há alguns anos, a Anglo American tenta vender seus ativos produtores de fosfatados no Brasil. Sempre aparece um fato que impede o negócio, hoje estimado em 4 bilhões de dólares, considerada a produção de nióbio.
À mineradora anglo-sul-africana tem restado desmentir, se reestruturar, e continuar. As esperanças renovadas agora vêm das norueguesa Yara e norte-americana Mosaic.
Mais uma vez, fatores de mercado não são propícios ao negócio. Pelo menos, no que se refere à precificação dos ativos. A Yara comprou 60% da nacional Galvani. Em todo o caso, se confirmada a venda, será mais um capítulo, dos vários que se sucederam nas duas últimas décadas, da concentração da produção de fertilizantes no Brasil.
Pátria educadora
A queda de 12% no consumo de fertilizantes químicos e minerais e de mais de 20% na venda de agrotóxicos, em 2015, poderão servir como lição de casa para os agricultores brasileiros: não precisa tanto assim; há alternativas; no final, o bolso agradecerá.
O mesmo não se pode dizer da queda na venda de caminhões e máquinas agrícolas. Assim como nos automóveis, até quando iria a farra? Vacas gordas renovaram seus patins e deixaram bolhas para a indústria.
No capitalismo tudo é cíclico. Menos a concentração da riqueza.
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