Política

Incongruências dos Mapa, FAO e Graziano

Por que não seguem a projeção mais dez anos? É fácil e muito provável que eu não esteja mais aqui para me irritar com essa bobagem

Caboclos, caipiras, campesinos, sertanejos, se esfolam para produzir o que comemos e bebemos
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E aí? Todos com seus umbigos pregados no embate Lula versus Carminha Grisalha e Moro Lábios Finos? Ainda com dúvidas de que o feito veio para ficar por décadas? Então tá, frouxos, acharam que o Acordo Secular de Elites, bancado há mais de meio século pela Rede Globo, iria aceitar um capitalismo brasileiro menos selvagem?

Esqueçam, eles nos fazem o nada. Somos dominados por uma corja de canalhas e um tsunami pele-laranja norte-americano chamado Donald Trump.

“Nada além, nada além de uma ilusão, chega bem, que é demais para o meu coração, acreditando em tudo que o amor mentindo sempre diz”. Sou um adito. Pensaram se livrar de uma referência musical? Aí estão Custódio Mesquita e Mário Lago, cantados por Orlando Silva.

O horror Trump, nunca ouviu essa pérola brasileira, nada leu de Drummond, e como tantas vezes aqui previsto, sente-se no direito de ferrar o planeta. Nada diferente dos anúncios de aonde iria dar o golpe contra Dilma Rousseff. 

Prolegômenos feitos, vamos ao que, ultimamente, pouco interessa aos leitores e leitoras da coluna: agronegócio, agropecuária, segurança alimentar, pobreza rural.

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Primeiro: o jornal “Valor”, sucursal paulista de “O Globo”, publicou no mês de julho, uma revista com título “O Poder do Campo”, e lide “Influência decisiva na economia e na política do país”.

Em 114 páginas, nenhuma vez cita a situação do agricultor brasileiro familiar, de assentamentos, tribos indígenas e quilombolas, em bonés corroídos, botinas gastas, rotas calças jeans. Dei-me ao trabalho: 38 fotos de executivos engravatados, analistas pontificantes, largos sorrisos; um colhedor de mangas na lida.

Claro. O que este imbecil queria se a edição é patrocinada pelas Dow/Dupont, Aliança Cabotagem, Jacto, Nissan, Bradesco, Santander, Volkswagen, Mercedes-Benz, Copebrás, Toledo Balanças, Chevrolet, Usina São Martinho, Yara, entre outras, menores, mas vistas sem a necessidade de lupa? Esta, se eu quiser, terei que arrancar de seus fecundos rabos.

Nada de novo: caboclos, caipiras, campesinos, sertanejos, se esfolam para produzir o que comemos e bebemos, mas nesse excremento publicitário nunca terão vez, o mesmo quando eu os defendo e assino. ‘Who Am I?’

Da merda do Censo Agropecuário 2017, creio já ter escrito. Foi feito para proveito da bancada ruralista. Felizes: cresceu o uso de agrotóxicos (mais 20,4%, em dez anos). “Pogresso, sabiam”?

Da entrega de nossos recursos naturais ao capital estrangeiro, creio, também ter escrito. Que a majestosa soja passaria por dificuldades o fiz há mais de seis meses – hoje, motivos diversos fazem suas cotações caírem, em Chicago, aos níveis de 2007, mas Trump briga com os turcos e faz o câmbio dar uma ajudinha enquanto a horrenda tabela de fretes desarranja. Então, se virem.

Como se Congresso, Judiciário e mídia não houvessem destruído democracia e economia brasileiras, intensifica-se o processo de desmatamento que poderá, segundo pesquisadores do Instituto SOS Pantanal, inviabilizar a disponibilidade de água naquele bioma.

É quando surge mais uma projeção do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, que a sucursal de “O Globo” em São Paulo publica com galhardia e Valor: “Expansão em (quase) todas as frentes” (8/8).

A produção de grãos prevista para a safra 2027/28 crescerá quase 30%, para 301,8 milhões de toneladas. Hoje em dia, estamos em torno de 233 milhões. Soja e milho na grandeza; arroz e feijão na rabeira. A pataquada de sempre, como bem entenderão os inteligentes leitores e leitoras de CartaCapital.

Tomam-se as séries históricas, algumas tendências óbvias de inovações tecnológicas, o aprofundamento monocultor nos maiores países produtores e exportadores, uns acepipes de guerras comerciais, planilhas e cabeças em cabresto e o Excel ditará ao planeta o que acontecerá com a nossa fome nos próximos dez (com louvor) anos.

Acreditamos. Alguns vibraremos com o papel preponderante do Brasil nessa epopeia. Por que não seguem a projeção mais dez anos? É fácil e muito provável que eu não esteja mais aqui para me irritar com essa bobagem.

Até que surge a FAO com raciocínio diferente. Na próxima coluna se eu não mudar de ideia.   

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