Política

Michel Temer, do sonho ao pesadelo

Desastrado rompimento do PMDB com o governo e planos neoliberais pós-impeachment deixam vice-presidente em apuros

Apoie Siga-nos no

Era para ser uma semana triunfante para o vice-presidente Michel Temer. Por obra dele, o PMDB, partido que comanda, romperia com Dilma Rousseff, inspiraria outras siglas governistas a segui-lo e aí o impeachment seria questão de tempo.

E para tentar cativar desde já o empresariado, um porta-voz do vice encarregava-se de vender à praça os planos econômicos neoliberais de Temer. Mas as coisas não saíram exatamente como imaginado. Ao contrário. Temer parece em apuros.

O PMDB de fato abandonou a canoa governista, na terça-feira 29, sem conseguir, contudo, arrastar qualquer partido junto. Pior. Ao abrir mão de cargos federais, deu uma espécie de cheque especial para o Palácio do Planalto recompor sua base aliada com a distribuição de espaços antes ocupados por peemedebistas.

Uma dia após o rompimento, o gabinete do ministro Ricardo Berzoini, da Secretaria de Governo, viu uma romaria de parlamentares interessados em ocupar, diretamente ou via apadrinhados, as vagas disponíveis. Seriam contemplados na medida do possível e desde que se comprometessem a votar contra o impeachment e a apoiar o governo até 2018.

Um dos que participaram da romaria foi o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ). Ele foi ao Planalto junto com o ministro da Saúde, o deputado peemedebista Marcelo Castro, a fim de negociar a permanência do mesmo.

Dos sete ministros indicados pelo PMDB, só um se demitiu. Os demais fizeram de tudo para ficar, dirigiram inclusive apelos pessoalmente a Dilma Rousseff. Uma desmoralização para a autoridade de Temer como dirigente partidário.

Rival pelo controle do PMDB, o presidente do Senado, Renan Calheiros, definiu assim a debandada peemedebista articulada por Temer: “Foi um movimento pouco calculado, (pouco) inteligente”.

O único ministro do PMDB a demitir-se foi Henrique Alves, até então no Turismo. Alves é alvo de um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) aberto há pouco graças a descobertas da Operação Lava Jato. No mesmo inquérito, está o presidente da Câmara, Eduardo Cunha.

Cunha é outra razão para Temer estar em maus bocados após o PMDB afastar-se do Planalto. Dono de uma imagem pública desgastada devido a seu currículo, réu no STF por corrupção, Cunha virou um dos símbolos do rompimento. Pior para Temer.

“Como anão moral, traidor e parceiro íntimo de tudo que não presta, à frente deste capítulo do golpe de estado em marcha no Brasil, Michel Temer e seu sócio Eduardo Cunha”, escreveu no Facebook o presidenciável Ciro Gomes, do PDT, logo após a decisão do PMDB.

Afastar o PMDB do PT era um desejo antigo de Cunha, a sonhar com a derrubada de Dilma para, talvez, a Lava Jato ser amordaçada pelo governo seguinte e ele salvar a pele. Uma versão incômoda para Temer, presumível incumbido do serviço sujo de abafar as investigações.

Para tentar desfazer a impressão de compromisso com alguma missão amordaçadora, Temer disse na quinta-feira 31, durante reunião na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), ser favorável às investigações.

Ao liderar o rompimento do PMDB com o governo, Temer também atraiu para si a ira petista e do Planalto. O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT), disse em entrevista a um jornal de seu estado, o Ceará, que Temer está “no comando dessa operação do golpe”.

O líder no Senado, Humerto Costa (PT-PE), disse da tribuna da Casa que os petistas irão infernizar a vida de Temer, caso este assuma o lugar de Dilma. “Vossa Excelência será o próximo a cair, porque nós do PT, dos movimentos sociais e todos aqueles que defendemos a democracia, e já estamos mobilizados nas ruas, vamos seguir ocupando o Brasil inteiro, de norte a sul, para denunciar a ruptura da ordem democrática e dizer que não aceitamos qualquer tipo de golpe.”

A própria Dilma Rousseff alfinetou Temer ao lançar, na quarta-feira 30, a terceira fase do programa oficial de construção de moradias populares, o Minha Casa Minha Vida. Segundo ela, querem “tirar o governo para golpear direitos garantidos da população”.

Uma cutucada facilitada pelo vice-presidente. Às vésperas de o PMDB separar-se do PT, o comandante do órgão peemedebista de estudos, Moreira Franco, deu uma entrevista a O Estado de S. Paulo sobre a agenda econômica do partido. Aliado de Temer, Franco transmitiu o que seria um governo pós-impeachment

Entre as propostas, estão a redução dos financiamentos do Minha Casa Minha Vida, privatizações, enxugamento do Bolsa Família, do Pronatec, o programa de bolsas de estudo para cursos técnicos, e do Fies, de crédito a estudantes universitários. Ideias a se juntar ao plano “Ponte para o Futuro”, lançado pelo PMDB no fim do ano passado.

“É um programa de restauração do neoliberalismo. Nunca um Presidente da República seria eleito com um programa como o Ponte para o Futuro”, disse da tribuna o senador Lindberg Farias (PT-RJ). Críticas existentes também no PMDB. Caso do senador Roberto Requião (PR), para quem os planos de Temer foram feitos na medida para o interesses do sistema financeiro. 

A negativa repercussão do plano levou Moreira Franco, um ex-ministro de Dilma, a dar outra entrevista, desta vez à Folha de S. Paulo, a fim de tentar convencer o País de que o PMDB não pretende cortar gastos sociais.

Diante dos últimos acontecimentos e pelo que se ouve no PT e no Planalto, Michel Temer que se prepare. Se a última semana esteve longe de ser inesquecível, as próximas não devem ser diferentes.

ENTENDA MAIS SOBRE: , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar