Política

O consumidor pode ensinar algo ao eleitor?

Essa luta passa pela garantia do exercício do direito individual, mas também do coletivo

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por Fulvio Giannella Jr. e Carlos Thadeu C. de Oliveira*

 

A chegada de milhões de consumidores ao mercado de consumo não é apenas uma oportunidade econômica para o país. Ultimamente, tem se mostrado também uma oportunidade eleitoral. E é natural que seja assim: qualquer marqueteiro político sabe que um candidato precisa de uma bandeira ampla o bastante para poder atingir o máximo de eleitores. E se for num segundo turno, é um trunfo de valor inestimável.

É certo que o consumidor não é uma entidade nova, mas também é fato que o eleitor já não é mais uma (id)entidade que tenha forte apelo – são generalizados o descrédito na política e a ideia de acabar com o voto obrigatório. Queiramos ou não, muitas pessoas se identificam e são identificadas mais como consumidores que qualquer outra categoria social ou econômica e, oportunamente, como eleitores, cidadãos etc. Como ninguém é uma coisa OU outra, mas tudo junto, cabem algumas colocações a respeito das eleições. Isso se faz ainda mais necessário quando as principais forças político-eleitorais perderam suas bandeiras típicas e boa parte de seu eleitorado. O que sobrou, portanto, é aparentemente muito genérico e passível de apropriação por qualquer um.

A verdadeira luta pela proteção e defesa dos consumidores não tem dono, credo, raça nem filiação partidária, mas tem método, ética, responsabilidade e compromisso. Para que ela se incorpore numa disputa eleitoral, tem de carregar isso tudo e se traduzir em conteúdo programático de uma candidatura.

Nesse sentido, o Idec, conjuntamente com as demais entidades do FNECDC (Fórum Nacional de Entidades Civis de Defesa do Consumidor), lançou recentemente a Plataforma dos Consumidores para as Eleições Municipais de 2012, disponível no site do instituto.

Trata-se de um conjunto de reivindicações aberto à adesão por qualquer candidato majoritário do país, mas que exige dos postulantes às prefeituras compromissos bem mais sólidos com os cidadãos que a simples resolução pontual e fugaz de problemas individuais ou a troca de favores. Não é uma proposta de Personal Procon e nem mesmo um convite à filiação às entidades.

Além de buscar resgatar conteúdo político específico, a Plataforma visa, também, diminuir o espaço para velhas formas na política brasileira, o clientelismo, o patrimonialismo e o populismo. Essas figuras, embora despontem também em contextos democráticos, são a antítese da democracia, porque minam suas bases: a igualdade, a liberdade, a impessoalidade e os valores republicanos. O clientelismo é quando há relação de troca sem igualdade entre as partes e sem liberdade de pelo menos uma, que é submissa à outra porque possui menos poder; o patrimonialismo confunde relações pessoais e privadas com regras públicas, corrompendo Estado e indivíduos; e o populismo destrói as construções sociais e políticas, já que visa estabelecer uma relação sem qualquer mediação entre um líder e seus seguidores. As experiências históricas no Brasil e no mundo que deram voz a esses fenômenos quase sempre acabaram em desastre.

Logo, a proteção e a defesa do consumidor não podem ser feitas de qualquer modo. Embora tenhamos grandes problemas a superar, essa luta passa pela garantia do exercício do direito individual, mas também do coletivo. Passa pela crítica, mas também melhoria das instituições públicas de defesa do consumidor (Secretaria Nacional do Consumidor, Procons, polícias especializadas), das instituições complementares (defensorias, ministérios públicos, agências reguladoras), das entidades da sociedade civil (ainda tão débeis e desamparadas) e também das empresas privadas. Vivemos grandes problemas com essas instituições e com o chamado “mercado”, mas não inventaram ainda nenhum modelo melhor de defender o consumidor se não o de estabelecer relações de diálogo e também de vigilância entre elas. Esse caminho não é fácil nem imediato: é preciso ouvir e informar o consumidor, compilar dados, investigar, propor melhorias na regulação, mover ações coletivas e individuais, pressionar os três poderes, ir a tribunais, promover campanhas, fiscalizar produtos e serviços, enfim, atuar em todas essas frentes ao mesmo tempo.

Em época de eleições, o caminho é particularmente difícil para as entidades civis de defesa do consumidor: elas devem se distanciar de campanhas específicas, preservando o que deve ser seu maior valor, a independência política. Seus membros, como cabe numa democracia, podem se envolver em campanhas e até se candidatar, mas nunca carreando suas organizações para a aventura eleitoral. Devem escolher entre uma ou outra coisa.

Que neste momento especial o eleitor, tão desiludido e desesperançoso com o futuro, resgate do consumidor que traz dentro de si, uma lição do dia a dia: o barato de hoje pode, às vezes, custar mais caro adiante.

 

Fulvio Giannella Jr. é coordenador-executivo do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) e Carlos Thadeu C. de Oliveira é gerente técnico da mesma organização.

por Fulvio Giannella Jr. e Carlos Thadeu C. de Oliveira*

 

A chegada de milhões de consumidores ao mercado de consumo não é apenas uma oportunidade econômica para o país. Ultimamente, tem se mostrado também uma oportunidade eleitoral. E é natural que seja assim: qualquer marqueteiro político sabe que um candidato precisa de uma bandeira ampla o bastante para poder atingir o máximo de eleitores. E se for num segundo turno, é um trunfo de valor inestimável.

É certo que o consumidor não é uma entidade nova, mas também é fato que o eleitor já não é mais uma (id)entidade que tenha forte apelo – são generalizados o descrédito na política e a ideia de acabar com o voto obrigatório. Queiramos ou não, muitas pessoas se identificam e são identificadas mais como consumidores que qualquer outra categoria social ou econômica e, oportunamente, como eleitores, cidadãos etc. Como ninguém é uma coisa OU outra, mas tudo junto, cabem algumas colocações a respeito das eleições. Isso se faz ainda mais necessário quando as principais forças político-eleitorais perderam suas bandeiras típicas e boa parte de seu eleitorado. O que sobrou, portanto, é aparentemente muito genérico e passível de apropriação por qualquer um.

A verdadeira luta pela proteção e defesa dos consumidores não tem dono, credo, raça nem filiação partidária, mas tem método, ética, responsabilidade e compromisso. Para que ela se incorpore numa disputa eleitoral, tem de carregar isso tudo e se traduzir em conteúdo programático de uma candidatura.

Nesse sentido, o Idec, conjuntamente com as demais entidades do FNECDC (Fórum Nacional de Entidades Civis de Defesa do Consumidor), lançou recentemente a Plataforma dos Consumidores para as Eleições Municipais de 2012, disponível no site do instituto.

Trata-se de um conjunto de reivindicações aberto à adesão por qualquer candidato majoritário do país, mas que exige dos postulantes às prefeituras compromissos bem mais sólidos com os cidadãos que a simples resolução pontual e fugaz de problemas individuais ou a troca de favores. Não é uma proposta de Personal Procon e nem mesmo um convite à filiação às entidades.

Além de buscar resgatar conteúdo político específico, a Plataforma visa, também, diminuir o espaço para velhas formas na política brasileira, o clientelismo, o patrimonialismo e o populismo. Essas figuras, embora despontem também em contextos democráticos, são a antítese da democracia, porque minam suas bases: a igualdade, a liberdade, a impessoalidade e os valores republicanos. O clientelismo é quando há relação de troca sem igualdade entre as partes e sem liberdade de pelo menos uma, que é submissa à outra porque possui menos poder; o patrimonialismo confunde relações pessoais e privadas com regras públicas, corrompendo Estado e indivíduos; e o populismo destrói as construções sociais e políticas, já que visa estabelecer uma relação sem qualquer mediação entre um líder e seus seguidores. As experiências históricas no Brasil e no mundo que deram voz a esses fenômenos quase sempre acabaram em desastre.

Logo, a proteção e a defesa do consumidor não podem ser feitas de qualquer modo. Embora tenhamos grandes problemas a superar, essa luta passa pela garantia do exercício do direito individual, mas também do coletivo. Passa pela crítica, mas também melhoria das instituições públicas de defesa do consumidor (Secretaria Nacional do Consumidor, Procons, polícias especializadas), das instituições complementares (defensorias, ministérios públicos, agências reguladoras), das entidades da sociedade civil (ainda tão débeis e desamparadas) e também das empresas privadas. Vivemos grandes problemas com essas instituições e com o chamado “mercado”, mas não inventaram ainda nenhum modelo melhor de defender o consumidor se não o de estabelecer relações de diálogo e também de vigilância entre elas. Esse caminho não é fácil nem imediato: é preciso ouvir e informar o consumidor, compilar dados, investigar, propor melhorias na regulação, mover ações coletivas e individuais, pressionar os três poderes, ir a tribunais, promover campanhas, fiscalizar produtos e serviços, enfim, atuar em todas essas frentes ao mesmo tempo.

Em época de eleições, o caminho é particularmente difícil para as entidades civis de defesa do consumidor: elas devem se distanciar de campanhas específicas, preservando o que deve ser seu maior valor, a independência política. Seus membros, como cabe numa democracia, podem se envolver em campanhas e até se candidatar, mas nunca carreando suas organizações para a aventura eleitoral. Devem escolher entre uma ou outra coisa.

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