Política

Plano Temer aprofunda desigualdades

Privatizações e pagamento da dívida de um lado, cortes em saúde, educação e Previdência do outro. Acabou conciliação pós-ditadura, diz economista

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No dia em que assumiu, o presidente interino Michel Temer disse que era “urgente pacificar a nação e unificar o Brasil”. Seu primeiro mês no cargo mostra, contudo, o governo provisório com planos capazes de ampliar a histórica divisão social do País, com reflexos políticos imprevisíveis.

De um lado, Temer destrava negócios de interesse do capital e dos investidores. Baixou uma medida provisória pró-privatizações e lucros na área de infraestrutura, a 727, quer priorizar o pagamento da dívida pública e apoiou a aprovação, na Câmara, de reajuste salarial para servidores públicos, uma categoria de renda superior à nacional.

De outro, quer mudar a Constituição para segurar despesas com saúde, educação e aposentadorias, um prejuízo às camadas inferiores da população, dependentes de políticas públicas.

Na quarta-feira 15, Temer apresentou a líderes de partidos aliados uma proposta que o governo provisório mandará ao Congresso para barrar o aumento real de verba para saúde e educação, entre outras áreas. Logo será a vez de enviar uma reforma da Previdência.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, capricha na construção de um cenário catastrófico, algo capaz de justificar benesses a investidores, não importa o custo social. Já ampliou de 100 bilhões para 170 bilhões de reais a previsão de déficit público em 2016 e agora projeta a maior recessão da história brasileira.

Com uma agenda assim, não surpreende que nenhuma autoridade, incluído aí o presidente interino, tenha falado até aqui em “distribuição de renda”.

“Não descarto a possibilidade de recuperação econômica, mas esta se dará sem inaugurar um ciclo de expansão do parque produtivo, com baixo dinamismo e estagnação da renda per capita”, afirma Marcio Pochmann, ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Para ele, um estudioso da história e do pensamento econômico, o governo Temer é o primeiro desde o fim da ditadura a abandonar qualquer tentativa de conciliação de classes no País.

Até nas gestões conservadoras de Fernando Collor (1990-1992) e Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), diz, havia representantes de trabalhadores no Ministério, algo inexistente agora.

“Se o Temer se fixar [na Presidência], vamos ter saudades do FHC. Este teve uma estratégia de distribuição de renda com o combate à inflação. Com o Temer, teremos a soberania da dívida pública, um governo dos ricos, dos rentistas, do capital estrangeiro.”

A falta de conciliação representada pelo governo provisório e sua agenda ampliadora de fossos sociais eram visíveis desde antes da posse de Temer. Isso foi admitido em público por um dos autores da Ponte para o Futuro, documento do PMDB a conter os planos do interino.

“Esse documento não foi feito para enfrentar o voto popular. Com um programa desses não se vai para uma eleição”, disse ao Estado de S. Paulo de 18 de abril, um dia após o impeachment passar na Câmara, Roberto Brant, um dos autores do documento e ministro da Previdência no governo FHC.

Amigo de Temer, o senador Roberto Requião (PMDB-PR), um dos mais ativos articuladores contra a aprovação final do impeachment de Dilma Rousseff, ficou surpreso com a agenda do interino e acha que ela não tem chances de se viabilizar. Inclusive pela personalidade presidencial.

“Michel Temer tem uma história de conciliação. Ele foi presidente da Câmara três vezes porque ele concilia os interesses”, disse Requião na votação inicial do impeachment no Senado. “Não é um radical, embora as propostas colocadas tenham sido até agora propostas radicais para encantar o mercado, viabilizar a fascinação dos banqueiros e dos rentistas. Não vai acontecer isso no Brasil.”

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